Não foram poucas as séries que resolveram construir sua essência tendo como pano de fundo um olhar saudosista ao passado, com especial atenção à infância e adolescência. E muitas delas conseguiram ficar no imaginário do público, como Anos Incríveis e Todo Mundo Odeia o Chris, ou mais recentemente sucessos como The Goldbergs. A nova aposta da CBS, Young Sheldon, pega carona no fenômeno, ao mesmo tempo que procura dar fôlego à série da qual se originou.
The Big Bang Theory vem sofrendo com uma grande dificuldade em manter o antigo (e muito fiel) público em frente à TV para assistir aos pouco mais de vinte minutos de um show que insiste em fazer um humor emperrado – quando não, engessado. Com isso em mente, Chuck Lorre e o canal não pensaram duas vezes em pegar Sheldon Cooper, seu personagem mais carismático, e elaborar a construção de seu passado.
Ironia ou não, Young Sheldon conseguiu contrariar todas as expectativas acerca do programa: caiu nas graças de uma parcela do público que havia abandonado The Big Bang Theory, conquistou um público novo e carente de séries que mexessem com a memória afetiva e gerou uma imensa birra no fandom da série “original”. Cada um destes elementos está ancorado em uma justificativa diferente, que tentaremos explicar abaixo.
A série entrou na CBS sob o olhar desconfiado da crítica. Com falhas na história, que iam desde contradições com The Big Bang Theory (Sheldon sempre afirmou que teve uma relação muito distante com o pai, o que não vemos na série) a erros de casting (Sheldon de olhos azuis?), os primeiros episódios eram engessados, com roteiro frágil e calcado no excesso de fofura do mini Sheldon Cooper. Concomitantemente, ela quebrava aquele humor irônico, autodestrutivo e um tanto sarcástico pelo qual o personagem ficou marcado, o que afastou parte do fandom. Em contrapartida, a quebra de formato do show (filmado também em cenas externas e sem claque) atraiu um público que havia se distanciado dos nerds, além de uma audiência nova.
Ironia ou não, Young Sheldon conseguiu contrariar todas as expectativas a cerca do programa: caiu nas graças de uma parcela do público que havia abandonado The Big Bang Theory, conquistou um público novo e carente de séries que mexessem com a memória afetiva e gerou uma imensa birra no fandom da série ‘original’.
Nada disso, no entanto, teria dado certa se os roteiristas não tivessem trabalho com empenho para dar força ao programa, especialmente no momento em que ampliaram a participação de alguns personagens, tirando a responsabilidade do ator mirim escalado, Iain Armitage, de carregar o seriado nas costas. Desta maneira, o espectador viu algumas performances bem interessantes, suficiente para dar a Young Sheldon tempo para cativar a audiência.
Jim Parsons assumiu a função de narrar em off a série, que apresenta ao público a formação do personagem que reluta em se conformar com regras tácitas da interação social. Diferente do Sheldon adulto, o mirim tem a seu favor a ausência de claque, que torna a personalidade condescendente e indelicada menos forçada. Não obstante, parece que, em momentos, ele ainda é excessivamente fofo, que talvez explique as razões para os coadjuvantes terem crescido tanto no decorrer da primeira temporada, encerrada em maio.
Enquanto Georgie (Montana Jordan) e Missy (Raegan Revord) ganharam mais espaço e serviram como contraponto não tão estereotipado, Zoe Perry (como Mary, mãe de Sheldon – a atriz é filha de Laurie Metcalf, que interpreta Mary em The Big Bang Theory) e Meemaw (a excelente Annie Potts, no papel de avó do protagonista) roubam a cena em muitos episódios, atuando como personagens antagônicos, que, mesmo não tendo muita influência na personalidade de Sheldon, são fundamentais na criação de uma zona de proteção para o garoto, que, em virtude da inteligência, avançou nos estudos e sofria com as relações sociais. Já Lance Barber, como George Senior, funciona como uma carta na manga, um alívio cômico interessante nessa selva de personagens tão diferentes entre si.
Young Sheldon, talvez, não irá ter vida longa, mesmo com números de audiência interessantes. Tudo depende muito de que forma a trama será conduzida, em especial de que maneira o humor seguirá sendo a tônica do programa, que deverá, em breve, cruzar com casos dramáticos na história do protagonista – como a morte de George Senior. De toda forma, é uma aposta ambiciosa da CBS, um experimento interessante para o universo de sitcoms. Quem viver, verá.