Uma das séries de humor mais interessantes no ar atualmente, Silicon Valley vinha sofrendo, em especial na terceira temporada, com a dificuldade em desenvolver a trama do programa e seguir sendo engraçada. Em perspectiva com outros seriados de humor, no ar ou não, a série criada por Mike Judge era a que menos havia avançado a história com três temporadas completas.
Na prática, isso levava a uma certa dificuldade em seguir acompanhando o programa, afinal, o humor soava repetitivo. Ainda que trabalhada de formas diferentes, a dificuldade em Richard (Thomas Middleditch), protagonista de Silicon Valley, obter sucesso com sua empresa, Pied Piper, havia chegado no ponto limite. Era pouco aceitável que o time de roteiristas da série não encontrasse outra forma de tornar a inabilidade social e profissional de Richard em uma trama bem-humorada e, ao mesmo tempo, avançar na história.
Para nossa sorte, a quarta temporada encontrou uma maneira interessante de fazer isso, dando fôlego à série da HBO. Ao fim da terceira temporada, Richard havia aberto mão da empresa, dando margem para que Dinesh e os demais tornassem ela em uma empresa de videochat, utilizando o algoritmo criado por si, enquanto ele seguia em outra direção tentando manter o idealismo de sua invenção.
Com a saída temporária de Gavin, até então o grande antagonista de Silicon Valley, e um maior equilíbrio entre Erlich Bachman (o excelente T. J. Miller) e os demais personagens, a série permitiu que as trapalhadas dos demais fossem melhor aproveitadas – e, por tabela, tornou as situações mais críveis. Ainda por cima, tirou o foco das piadas sobre os estereótipos do universo da tecnologia, utilizando o pretenso sucesso com a “nova internet”, a ideia de Richard de utilização de seu algoritmo, e o que fundamentou toda a temporada, para elaborar ótimas tiradas.
De forma até sutil, vários dos episódios da quarta temporada tiveram como alvo a pouca presença feminina nos grandes cargos das empresas de tecnologia.
Concomitantemente, esta foi uma das temporadas de humor mais crítico da história do seriado. No entanto, ao invés de utilizar o panorama político norte-americano, Judge e seu time de roteiristas optou por lançar suas piadas sobre o conservadorismo e o machismo do universo do Vale do Silício, práticas de trabalho análogas à escravidão e sobre o conceito de liberdade e privacidade na rede. De forma até sutil, vários dos episódios da quarta temporada tiveram como alvo a pouca presença feminina nos grandes cargos das empresas de tecnologia – curiosamente, meses depois aconteceria a polêmica envolvendo um funcionário do Google. Mas, certamente, a privacidade (ou sua ausência) na internet foi o tema que rendeu o maior número de piadas (e reflexões): afinal, ao que estaríamos dispostos em troca de uma rede sem barreiras?
Claro que as mudanças realizadas não serviram para apagar a presença do protagonista de Silicon Valley. Na realidade, elas mantiveram os holofotes sobre Richard, mas agora um mais idealista e menos preocupado em sucesso financeiro. Entretanto, houve maior desenvolvimento de seu perfil. Seja sob o viés amoroso, seja sob o viés do empreendedor idealista, o personagem interpretado por Middleditch conseguiu recuperar o espaço que durante a segunda e terceira temporadas havia sido de T. J. Miller, impedindo, por exemplo, que ocorresse com a série o que ocorre com The Big Bang Theory, onde Sheldon é maior que o próprio show.
Mas todas essas mudanças tiveram um preço. Esta foi a última temporada com a presença de Erlich, já que T. J. Miller, Mike Judge e HBO decidiram que o ator já estava grande demais para o personagem e acertaram que ele deixaria a série para desenvolver novos projetos dentro da própria emissora. Sendo assim, criam-se novas oportunidades para o ano seguinte do seriado, já que perde um coadjuvante que, por dois anos, foi o grande motivo para que acompanhássemos o programa. A ver o que nos espera.