As diferentes fases da Lua. As estações do ano. O passar do dia, do amanhecer ao cair da tarde, até a noite se instalar por completo. A existência se dá em ciclos, que se iniciam e terminam, para anunciar outro recomeço, porque assim é, ou dessa forma é percebida, talvez por tornar-se, assim, mais fácil de ser compreendida.
Difícil é lidar com a ideia do fim absoluto, definitivo. E não me refiro apenas à morte, que, para algumas culturas, é apenas a chegada de uma nova maré, mas para os existencialistas é o desfecho inevitável, um arremate que já existia como certeza, antes do primeiro sopro, dos primeiros passos ou palavras dadas. Viver, enfim, é acumular pontos finais.
Escreve Drummond, meu poeta favorito desde que me lembro: “Mas as coisas findas muito mais que lindas, essas ficarão”. A beleza fatalista, mas também infinita, desses versos perfura, dói, chuta o peito. Chama-se “Memória” o poema curto de onde eles vêm. Não poderia ter outro título. Temos, somos memória. Sem ela, viramos pó.
Escreve Drummond, meu poeta favorito desde que me lembro: ‘Mas as coisas findas muito mais que lindas, essas ficarão’. A beleza fatalista, mas também infinita, desses versos perfura, dói, chuta o peito. Chama-se ‘Memória’ o poema curto de onde vêm. Não poderia ter outro título.
Ilude-se quem se julga capaz de negar o passado, pintar por cima, fazer de conta que não foi. Basta raspar as camadas de tinta, peles de cores e texturas que sobrepõem a revestir a parede, para lá no fundo encontrar seus vestígios, suas marcas, a essência.
Imersos em ciclos, em narrativas com princípio, meio e fim, somos o resultados da soma, e não da subtração dessas fases. “As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão”, diz Drummond no mesmo poema. Quando se tenta explicar o mais profundo, sensível, a vida se esvai, porque já não cabe na explicação, no uso da racionalidade. Instrumentos inúteis diante da imensidão da maré que volta a subir.