A nova atração da Netflix, That ’90s Show, tem um público bem definido: ela é dedicada à geração que acompanhou as oito temporadas de The ’70s Show, produzida entre 1998 e 2006. Para isso, a série dá sequência a um dos eixos centrais da obra original – os pais Red (Kurtwood Smith) e Kitty (Debra Jo Rupp) – e os torna avós da filha de Eric (Topher Grace) e Donna (Laura Prepon).
Ou seja, este spin-off tem um objetivo central: cativar os que cresceram acompanhando esta sitcom divertida que levava aos jovens dos anos 2000 o astral que se imagina que pendia no ar durante a década de 1970 – o que se fortalecia com a alegre música tema entoada pela banda Cheap Trick.
Este contexto envolvia discos de rock setentistas, roupas boca de sino e muita maconha no porão de Red e Kitty. Por isso, That ’90s Show se propõe a resgatar o exato mesmo cenário. Mas agora, ao invés de Eric, o centro está em sua filha Leia (papel de Callie Haverda).
Ela resolve passar as férias com os avós e lá acaba formando uma nova turma. Toda a lógica em torno desse grupo se assemelha ao original. Leia é nerd, como seu pai (seu nome, aliás, remete a Star Wars), e está de olho num bonitão desmiolado, Jay (Mace Coronel), que, não por acaso, é filho de Kelso (papel de Ashton Kutscher, que volta também para a série).
Há um casal sem noção, tal qual Kelso e Jackie (Mila Kunis) e um amigo filho de imigrantes, da mesma forma que Fez (Wilder Walderrama). O único que não retorna é o sarcástico Hyde, por uma razão explícita: o ator Danny Masterson, que o interpretava, está sendo acusado de estupro por três mulheres.
Ou seja: That’s 90 Show transita entre a homenagem nostálgica e a total falta de originalidade. Mas o problema do spin-off, penso eu, é a falta de graça.
‘That ’90s Show’: pouco tempo e poucas risadas
https://www.youtube.com/watch?v=F36HBFGxWkg&t=4s
À primeira vista, o que mais me chamou atenção em That ’90s Show é a repetição completa de quase todos os elementos estéticos da série original. É muito intrigante notar que, vinte anos depois, os atores não mudaram nadinha: Red, Kitty, Donna, Eric, Kelso, Jackie e Fez continuam iguaizinhos.
Este spin-off tem um objetivo central: cativar os que cresceram acompanhando esta sitcom divertida que levava aos jovens dos anos 2000 o astral que se imagina que pendia no ar durante a década de 1970
Mas não falo apenas de eles terem bebido na fonte da juventude: todos os aspectos em torno deles são imutáveis. Nenhum deles renovou o corte de cabelo ou tipo de roupa; a casa de Kitty e Red não mudou nenhum detalhe.
O indicativo central de que estamos nos anos 1990 são o quarto da amiga de Leia, Gwen (Ashley Aufderheide), e as roupas que a turma usa. Todo o resto é basicamente anacronismo.
Contudo, há tentativas de atualizar o contexto “vale tudo” típico da década de 1990-2000, quando That ’70s Show foi ao ar. Com isto, quero dizer que há muitas questões referentes aos discursos de séries e filmes que hoje foram recontextualizados como tóxicos e precisaram ser repensados.
O exemplo mais óbvio é o do Fez original, cujo personagem foi acusado de estereotipar tanto os latinos (como bobos e pouco inteligentes) quanto os homossexuais (já que Fez, embora se interessasse por mulheres, era afeminado). Na nova versão, há Ozzie, que agora é gay e ensaia sair do armário.
Aliás, todo o círculo dos amigos é claramente montado pensando na diversidade: há duas pessoas negras, um asiático e um ator acima do peso, e não há no texto qualquer piada que sinalize a estas questões. A preocupação é louvável – ainda que, por outro lado, acabe soando um pouco forçado, tendo em vista que estamos diante de um spin-off de uma série que se passa em Wisconsin.
Para não dizer que não há nada de muito bom nesta nova série, vale lembrar que Red e Kitty seguem personagens adoráveis. O fato de que eles têm mais centralidade no spin-off é um ganho e tanto – que, aliás, passaria bem sem o uso de claque em pleno 2023.
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