Meu primeiro contato com Tubarão (1975), de Steven Spielberg, foi pela Sessão da Tarde. Na década de 1990, os filmes exibidos nas emissoras abertas do Brasil eram bem menos caretas do que nas últimas duas décadas. Na Rede Globo, por exemplo, Cassandra Peterson aparecia sem qualquer pudor ao emular as coreografias eróticas de Flashdance (1983) no sombrio e divertido Elvira: A Rainha das Trevas (1988).
Tenho lembranças de discutir por horas o quanto Gremlins (1984) era assustador com colegas da escola quando tinha oito anos. Uma menina, da qual não recordo o nome, disse que a mãe a proibiu de ver filmes de horror depois de não conseguir dormir por causa da obra de Joe Dante. A proibição fazia bastante sentido, uma vez que o gênero era raro na Sessão da Tarde, mas bem recorrente no SBT e na Band.
A Volta dos Mortos Vivos – Parte 2 (1988), Brinquedo Assassino 2 (1990) e O Ataque dos Vermes Malditos (1990) são alguns dos títulos que assisti nas tardes da minha infância quando sintonizava na emissora de Silvio Santos. Havia, inclusive, semanas especiais do Cinema em Casa com filmes de monstros. Nessa brincadeira, descobri Christine – O Carro Assassino (1983), que me apresentou ao universo literário de Stephen King, e Godzilla Contra o Monstro do Mal (1991), responsável pelo meu fascínio pela Toho.
Meus amigos e eu víamos nessas exibições de filmes de horror no meio da tarde uma maneira de burlar a censura dos pais. A experiência, por vezes assustadora, servia como um modo de reafirmar uma suposta coragem que rotineiramente era colocada à prova durante a infância.
A verdadeira festa, porém, era na Band. Em meados de 1996, José Mojica Marins vestia a capa de Zé do Caixão e invadia as tardes da criançada apresentando o Cine Trash com obras altamente inapropriadas para a faixa das 14h30. De cabeça, lembro de ver Boneca Assassina (1992), Monster – A Ressurreição do Mal (1986) e Creepshow: Show de Horrores (1982), exibido então como Creepshow – Arrepio do Medo. Durante o período em que esteve no ar, de segunda a sexta-feira era possível conferir produções com mortes violentas, criaturas abomináveis e um pouco de nudez no canal.
É bem possível que uma geração de fãs de horror tenham formado seus repertórios a partir da televisão aberta. Na época, a circulação de informações sobre cinema era mais escassa e praticamente inexistente para crianças. Meus amigos e eu víamos nessas exibições uma maneira de burlar a censura dos pais, que não nos deixavam pegar nada do gênero nas videolocadoras. A experiência, por vezes assustadora, servia como um modo de reafirmar uma suposta coragem que rotineiramente era colocada à prova durante a infância.
Nos últimos anos, houve um gradativo afastamento entre o público infantil e o cinema de horror. A televisão aberta, ao renegar o próprio cinema enquanto parte da programação, parece ser uma das responsáveis por isso. Se depender dos pais, as crianças jamais enfrentariam o medo em uma narrativa de monstro (digo isso pensando em como vou lidar com o tema com minhas filhas). É preciso que haja um espaço escondido do consumo. Para nós, isso se dava nas sessões descobertas no meio da tarde, acobertadas por uma suposta classificação indicativa sugerida para o horário. Talvez isso funcione de outra maneira na internet, mas não saberia dizer como. Estou ficando velho.