O longa Antes que eu vá conta a história de uma adolescente que se vê presa no mesmo dia, infindavelmente. Dia a dia, a protagonista Samantha Kingston (Zoey Deutch) acorda pela manhã com o despertador tocando e a certeza que viverá os mesmos acontecimentos, por mais que ela tente agir diferentemente do dia anterior. Dirigido pela norte-americana Ry Russo-Young e com roteiro de Maria Maggenti, o longa não é só a repetição do mesmo dia de suas personagens, mas também a repetição de outros tantos filmes que tem a mesma premissa.
Todo mundo sabe que Hollywood vem há tempos investindo cada vez menos em roteiros originais, preferindo adaptações e/ou remakes. É que as ideias originais são mais arriscadas. Mais fácil e garantido é requentar modelos e narrativas já testados e aprovados. Adaptado de livro (homônimo, de Lauren Oliver), o longa poderia, ainda, ter um aviso de “livremente inspirado” em algumas dessas outras tantas obras sobre gente que não consegue sair do mesmo dia. Ele tem um bocado de similaridade, por exemplo, com aquele mais famoso e mais bem acabado Feitiço do Tempo, de Harold Ramis, que traz no elenco um jovem Bill Murray em um dos seus mais célebres papeis.
No enredo de Antes que eu vá, Samantha Kingston é uma estudante do ensino médio. À noite, em uma festa na casa de um dos colegas, suas amigas agridem uma outra garota por ser a “diferentona”. Acusada de sociopata, jogam bebida em seu rosto e a expulsam aos gritos. Logo mais, essas mesmas amigas, voltando para casa, capotam o carro. Samantha acorda do acidente como se fosse um pesadelo, mas logo perceberá que está vivendo aquele dia fatídico mais uma vez. Assim, irá repetir todas as ações, falando do mesmo modo com sua família; indo para escola e vendo os mesmos acontecimentos e aulas; chegando à festa e vendo a agressão; e, por fim, novamente o acidente.
Daí em diante, ela tentará mudar seu destino repetitivo agindo diferente ou muito diferente; não fazendo nada ou tudo o que sempre quis. No fim, o roteiro nos dá alguma lição de moral cristã digna daquelas citações que a Clarice Lispector ou o Caio Fernando Abreu não escreveram, mas assinam aos montes no Facebook.
É difícil assistir ao filme sem se incomodar com a pesada sombra dos enormes clichês e lugares comuns que o roteiro nos propõe a todo instante.
É difícil assistir ao filme sem se incomodar com a pesada sombra dos enormes clichês e lugares comuns que o roteiro nos propõe a todo instante. No entanto, a direção tem lá seus momentos, propondo algumas cenas com um certo vigor, muito embora peque de forma primária em outros. A construção da protagonista e de seu grupo de amigas, em geral, é crível. Os demais personagens, porém, sofrem de uma bidimensionalidade flagrante. São quase caricaturas. Juliet Sykes (Elena Kampouris), a menina que sofre bullying, talvez seja o que há de pior nesse quesito de construção de personagem, tamanha a falta de preparo para o papel. Culpa, sobretudo, da direção que não lhe apontou os caminhos necessários a percorrer.
No fim, sobra pouco para o espectador. O que é uma pena, pois há coisas importantes ali que precisariam ser melhor abordadas e discutidas.
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