Cláudio Marques e Marília Hughes em seu segundo longa-metragem, A Cidade do Futuro (2016), trazem para a tela do cinema a relação entre três jovens, interpretados por Mila Suzarte, Gilmar Araújo e Igor Santos, em uma cidade no interior da Bahia. Enquanto o filme aborda sobre a formação do núcleo da pequena cidade, que nasceu a partir do deslocamento dos habitantes por conta da construção da hidrelétrica de Sobradinho, a relação entre Gilmar e Igor vai se desenrolando e Mila se descobre grávida de um deles, Gilmar.
Ao contrário do que poderia se imaginar, no entanto, não há conflito no relacionamento entre os três: pelo contrário. Mesmo com o olhar torto da maioria dos habitantes da pequena cidade, especialmente por conta do conservadorismo, Gilmar e Igor decidem formar uma família e cuidar da futura criança que Mila carrega. É interessante como o personagem de Igor se desenvolve ao longo da trama: inicialmente, ele, que trabalhava com vaquejadas, tem um certo receio da sua relação homoafetiva, principalmente por medo da reação das pessoas ao seu redor.
‘A Cidade do Futuro’ entra numa novíssima seara de filmes brasileiros que abordam representatividade LGBTQ+.
Um dos grandes trunfos do longa de Marques e Hughes é o deslocamento de uma narrativa que aborda sobre relações contemporâneas, particularmente o relacionamento entre Igor e Gilmar e, mais tarde, com Mila, para um ambiente que ainda é retratado no cinema brasileiro só e somente como um espaço de extrema desigualdade social em comparação ao eixo sul-sudeste do Brasil: o interior do Nordeste brasileiro. E é justamente por tratar dessa representação, talvez, que o longa se perde um pouco, por não se aprofundar sobre o espaço que cerca os personagens.
É visível, por exemplo, como as atuações, inclusive dos protagonistas, são de iniciantes, com falas que muitas vezes são quase que recitadas e diálogos quase que mecânicos, sem organicidade. É assim que o filme é construído, num tom que muitas vezes chega a irritar numa tentativa contínua de fazer o espectador entender situações óbvias que poderiam ser tratadas com um pouco mais de ritmo.
Apesar desse ponto fraco, A Cidade do Futuro tem uma trilha sonora bastante adequada, trazendo músicas de sertanejo universitário que geralmente embalam a região para a trama entre os personagens. Isso traz bastante verossimilhança com a realidade da narrativa, uma vez que, em certo momento da história, Igor passa a trabalhar numa estação de rádio local.
A Cidade do Futuro entra numa novíssima seara de filmes brasileiros que abordam representatividade LGBTQ+ em ambientes diversos, atípicos daqueles que a grande tela costuma retratar, como Corpo Elétrico (2017) e Antes o tempo não acabava (2016). Apesar do ritmo fraco e de alguma falta de profundidade na construção dos personagens, é de extrema importância que mais produções como essa sejam realizadas e, além disso, tenham a chance de sair do circuito de festivais para o circuito comercial.
ESCOTILHA PRECISA DE AJUDA
Que tal apoiar a Escotilha? Assine nosso financiamento coletivo. Você pode contribuir a partir de R$ 15,00 mensais. Se preferir, pode enviar uma contribuição avulsa por PIX. A chave é pix@escotilha.com.br. Toda contribuição, grande ou pequena, potencializa e ajuda a manter nosso jornalismo.