A Escavação (2021) é claramente um filme que tem como propósito dar notoriedade a alguém que contribuiu de forma considerável com a arqueologia, mas que, no decorrer das décadas, acabou sendo lançado à invisibilidade. É uma espécie de retratação pública, de pedido de desculpas póstumo a Basil Brown, aqui interpretado por Ralph Fiennes.
Basil Brown foi um arqueólogo amador e autodidata, também amante de astronomia. Em 1939, na localidade de Sutton Hoo, na Inglaterra, fez uma importante descoberta: um navio com várias peças antigas, considerado por especialistas como um dos únicos enterros de embarcações de anglo-saxões no país. A raridade estava em um terreno de Edith Pretty (Carey Mulligan), uma viúva também amante da arqueologia que contrata os serviços de Brown.
A câmera dirigida por Simon Stone é cuidadosa em seus movimentos e enquadramentos, dando um ritmo bastante agradável e dinâmico à narrativa. Baseada no livro de mesmo nome de John Preston, esta produção original da Netflix investe sem medo na sobriedade, na moderação, na discrição. É um filme livre de excessos, seja nos diálogos, no figurino, nos cenários, no roteiro ou na interpretação dos atores. A relação que se estabelece entre os personagens de Ralph Fiennes e Carey Mulligan, por exemplo, é bastante atraente, demonstrando cumplicidade, respeito e a parceria que costuma anteceder o sucesso na realização de grandes projetos.
Inexiste qualquer grande sobressalto no decorrer da história. Mas isso não quer dizer que ela não seja rica de detalhes. O roteiro, inclusive, trata de inserir tramas que orbitam ao redor da narrativa principal para tentar atrair mais a atenção
Inexiste qualquer grande virada no decorrer da história. Mas isso não quer dizer que ela não seja rica de detalhes. O roteiro, inclusive, trata de inserir tramas que orbitam ao redor da narrativa principal para tentar atrair mais a atenção: a doença de Edith, um casamento mal sucedido e as aventuras de um adorável menino de imaginação fértil e maturidade aparentemente acima da média para sua idade. Trata-se de Robert, o filho de Edith, interpretado por Archie Barnes.
O filme deixa bem claro que o carinho e a dedicação com as quais o protagonista lançou-se na empreitada são inversamente proporcionais ao reconhecimento que ele recebeu depois. E como é que a produção deixa isso “bem claro”? Expondo diante dos olhos do espectador a ausência de reconhecimento em forma de legendas. São palavras que contextualizam os acontecimentos para além daquilo que foi mostrado antes dos créditos finais tomarem a tela: “Apenas recentemente a importante contribuição de Basil foi reconhecida. Seu nome aparece junto ao de Edith na exposição permanente do Museu Britânico”. É por isso que este trabalho da Netflix é um evidente pedido de desculpas póstumo. Sóbrio. Moderado. Discreto. Como a alma do protagonista construído no filme.