O filme O Mistério do Gato Chinês (2019) é visualmente deslumbrante. Se diante de um bom filme de ação o espectador quase perde o fôlego graças à velocidade com que as cenas transcorrem em meio a tiros, perseguições, lutas constantes e elementos dessa natureza, nesta produção conjunta de China e Japão, o espectador é convidado a (quase) ter uma overdose de sensações visuais. A multiplicidade de cores, a riqueza de detalhes de objetos, cenários e figurinos, a rapidez com que algo posto em cena transforma-se em outra coisa, a passagem rápida de uma cena para outra coalhada de elementos estimulantes ao olhar fazem deste filme um delírio visual. Um delírio visual poético, lírico, bonito.
Embaralhando poderosamente as fronteiras existentes entre o que é real nos cenários e o que é trabalho de computação gráfica executado na pós-produção, O Mistério do Gato Chinês flerta com o monumentalismo, exibindo cenários gigantescos, amplos planos abertos e multidões em cena.
O filme está cheio de imagens que se desfazem no ar, com uma sucessão de mutações de realidades. Isso tudo, em sua profusão de detalhes projetados na tela grande na sala escura, cria uma aura etérea, motivando o espectador a sentir-se dentro de um longo sonho (o filme tem duas horas de duração). Ou dentro de um pesadelo, considerando alguns momentos da narrativa que, além da fantasia, também tem suas pitadas de horror.
Caso renda-se ao visual e deixe de dar tanta atenção e importância à história, o espectador é convidado a verificar nesta obra sino-japonesa um lindo exemplo do bom uso do realismo fantástico.
Mas as qualidades desta produção dirigida por Chen Kaige (de Adeus, Minha Concubina) param por aí. A história, em si, é confusa. Se a explosão de cores e truques para o olhar encantam, a narrativa sobre um gato que assassina integrantes da corte imperial cansa.
O poeta chinês Bai Letian (Huang Xuan) e o monge japonês Kûkai (Shôta Sometani) unem-se para tentar descobrir o mistério sobre esse animal que fala, come apenas os olhos dos peixes e, não raras vezes, costuma derramar sangue de humanos por onde passa. O roteiro percorre o caminho dos dois para tentar dar explicações aos fatos.
Caso renda-se ao visual e deixe de dar tanta atenção e importância à história, o espectador é convidado a verificar nesta obra sino-japonesa um lindo exemplo do bom uso do realismo fantástico, no qual o real está profundamente mergulhado em possibilidades inacreditáveis, encantadoras, assustadoras e maleáveis. Neste caso específico, com gato que fala, melancias que florescem e frutificam muito rapidamente, tigre que “explode” em pétalas de flores, cerejeiras floridas que não passam de ilusão e tantos outros exemplos. Está lançada uma boa proposta de escapismo, caso a ideia seja “comprada”.
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