Parece que tudo melhorará na vida de Orna (Liron Ben-Shlush) quando ela ingressa em uma luxuosa imobiliária comandada pelo empresário Benny (Menashe Noy). Ela tem uma recepção carinhosa, ganha um escritório bem estruturado e percebe a possibilidade de ganhos significativos com a venda de imóveis para um público de renda elevada. O novo emprego vem em boa hora. Seu marido Ofer (Oshri Cohen) investiu em um restaurante, mas o empreendimento não tem o retorno esperado e a situação financeira passa a ficar complicada. Sobretudo quando se tem três filhos.
A sinopse do filme israelense Não Mexa com Ela (2019) é bastante simples. Bastante simples, também, é o conjunto de escolhas narrativas feitas pela diretora Michal Aviad. A interpretação dos atores, a inexistência de recursos técnicos chamativos e o transcorrer natural da história (fundamentada em um roteiro bastante verossímil) buscam um naturalismo que flerta com o documental.
Não será nenhuma surpresa caso o espectador, em algum momento, flagre-se pensando que a câmera que capta uma ficção (um fluxo de acontecimentos roteirizado) tenha sido posta nos ambientes como espiã para documentar algo real. Toda essa naturalidade que beira o documental amplia o sentimento de desconforto na medida em que a história aproxima-se do seu clímax, com a situação gradualmente saindo do controle da protagonista.
Não representa nenhuma surpresa caso o espectador, em algum momento, flagre-se pensando que a câmera que capta uma ficção (um fluxo de acontecimentos roteirizado) tenha sido posta nos ambientes como espiã para documentar algo real.
O que inicialmente parecia promessa de uma vida próspera revela-se um pesadelo claustrofóbico para Orna. Benny, o chefe, começa a assediar sexualmente sua subordinada. O comentário sutil sobre a beleza dos cabelos soltos ou a sugestão discreta do uso de uma saia mais atraente para participar de uma reunião com clientes importantes vêm acompanhados não só da promessa de maiores ganhos como, também, de investidas cada vez mais ousadas por parte do patrão.
A espiral ascendente de constrangimento contextualiza um dos raros momentos em que Michal Aviad quebra a tendência de naturalismo de sua forma de contar a história e lança um recurso técnico-narrativo-metafórico significativo: o som estridente e irritante de um elevador que sobe em uma das altas construções comercializadas pelo pequeno império de Benny.
O barulho poderosamente incômodo é um sinal do estado vexatório que se estabelece na convivência entre os dois, patrão e empregada, quando o assédio começa a ganhar contornos mais concretos e, consequentemente, joga a situação para o nível do insustentável. Vexatório e insustentável para a protagonista e para o espectador minimamente empático com a personagem.
O caráter naturalista, quase documental, de Não Mexa com Ela reforça sua tentativa – louvável – de lançar os holofotes para a sensibilização do combate à violência contra a mulher, um assunto delicado e, infelizmente, ainda comum. Toda a repercussão do movimento #MeToo que o diga.
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