Uma das figuras mais biografadas da história, Napoleão Bonaparte (1769-1821) tem sido frequentemente revisitado em centenas de livros e inúmeras visões cinematográficas. Quando o cineasta Ridley Scott decidiu retratá-lo em uma superprodução de US$ 200 milhões, financiada pela Apple TV, o diretor de Gladiador e Blade Runner enfrentou o desafio de criar uma narrativa que cativasse e surpreendesse as novas gerações, dada a riqueza de informações já disponíveis sobre o líder francês.
O legado histórico de Napoleão é vasto, evidenciado por todas essas releituras de sua jornada, como a do clássico filme de Abel Gance em 1927, que já explorava sua grandiosidade por meio de técnicas inovadoras para a época. Scott, ao se interessar pelo fascinante capitão nascido na Córsega que se tornou imperador da França e conquistou grande parte da Europa, optou por destacar suas habilidades na condução de batalhas épicas. As cenas de confronto, especialmente em Toulon e Austerlitz, são magistralmente filmadas, proporcionando momentos memoráveis que não apenas destacam a estratégia militar de Napoleão, mas também sua singularidade como indivíduo.
O filme, contudo, não se limita apenas a aspectos históricos, militares, buscando explorar a vida íntima do personagem e seu perfil psicológico. Aí começam seus muitos problemas. O roteiro, assinado por David Scarpa, nesse sentido, parece ter sido escrito pelo ChatGPT, tamanha a sua superficialidade e ausência de fluidez narrativa.
‘Napoleão’: inexpressividade
O roteiro, assinado por David Scarpa, nesse sentido, parece ter sido escrito pelo ChatGPT, tamanha a sua superficialidade e ausência de fluidez narrativa.
Com uma duração de 2h30, o filme retrata Napoleão, interpretado por Joaquin Phoenix, como excêntrico e narcisista, o que não é novidade. Mas também sugere problemas significativos em seus relacionamentos, especialmente com mulheres, incluindo sua mãe e sua primeira esposa, Josephine, interpretada pela britânica Vanessa Kirby, indicada ao Oscar de melhor atriz por Pieces of a Woman (2020).
A interpretação de Phoenix busca humanizar o líder, destacando suas fraquezas e conflitos pessoais. O astro de Coringa opta por uma inexpressividade que, embora seja uma escolha interessante, carece de um roteiro mais consistente para justificá-la, resultando em uma representação rasa e, em certa medida, até unidimensional do personagem.
A relação de Napoleão com Josephine é retratada como um jogo de poder, sugerindo que ela teria desempenhado um papel crucial na formação do grande líder. O filme destaca suas habilidades sociais e emocionais superiores em relação às limitações do marido. Para um retrato ambivalente de Napoleão se consolidar, seria necessário um roteiro mais robusto que explorasse com mais complexidade as várias facetas do personagem, ao invés de apresentá-lo de forma episódica e fragmentada, deixando de lado relações significativas, como a com seu irmão e mãe, aspectos cruciais em sua vida.
Além deles, outros personagens, em Napoleão, são introduzidos e posteriormente negligenciados no filme, sem receberem explicações adequadas. Isso inclui os filhos de Josephine, a segunda esposa Maria Luísa, filha do imperador da Áustria, e diversos nomes proeminentes da história política francesa que parecem estar presentes apenas como elementos ilustrativos na narrativa.
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