Dois longas-metragens atualmente em exibição nos cinemas brasileiros são obras baseadas em fatos reais que trazem como protagonistas figuras subversivas que, em diferentes épocas, desafiaram o estado de coisas nos Estados Unidos: Snowden, do controverso cineasta Oliver Stone (duas vezes vencedor do Oscar de melhor direção, por Platoon e Nascido em 4 de Julho), e Um Estado de Liberdade (de Gary Ross, de Seabiscuit – Alma de Herói).
Em cartaz desde a semana passada, Snowden reconstitui com esmero a trajetória de Edward Snowden (Joseph Gordon-Levitt, de 500 Dias com Ela), funcionário da NSA (Agência de Segurança Nacional), órgão ligado à CIA, que revelou ao mundo, por meio de uma série de reportagens publicadas pelo jornal britânico The Guardian, que o governo norte-americano, tanto na administração do presidente George W. Bush quanto na de Barack Obama, espionou ligações telefônicas, e-mails e atividades nas redes sociais de milhões de cidadãos norte-americanos, sem falar de funcionários e líderes governamentais ao redor do mundo, entre eles a ex-presidente Dilma Rousseff, do Brasil.
Stone, um diretor fortemente engajado em causas progressistas nos EUA, assumidamente de esquerda, transforma Snowden em um ícone da resistência democrática diante dos desmandos cometidos pelo governo de seu país em nome de uma suposta guerra contra o terrorismo.
Stone, um diretor fortemente engajado em causas progressistas nos EUA, assumidamente de esquerda, transforma Snowden em um ícone da resistência democrática.
O filme, um thriller político bastante envolvente, retrata Snowden como um jovem de perfil conservador que ingressa na CIA movido por sua paixão pelo mundo dos computadores (era um autodidata, sem formação universitária) e por um nacionalismo, que aos poucos se esfacela, à medida que percebe o uso arbitrário, senão perverso, do seu trabalho, e resolve tornar públicos esses abusos.
Atualmente refugiado na Rússia, Snowden, interpretado com detalhismo cirúrgico por Gordon-Levitt, que emula desde sua linguagem corporal até seu tom de voz, é apresentado pelo filme de Stone como um herói injustiçado, numa clara crítica do diretor aos rumos que seu país tomou desde os ataques de 11 de Setembro de 2001, retratados por ele no filme As Torres Gêmeas.
Guerra Civil
O idealismo e a subversão conecta Snowden a outra produção, Um Estado de Liberdade, que estreia hoje nos cinemas do país. Matthew McConaughey (vencedor do Oscar de melhor ator por Clube de Compras de Dallas) interpreta o papel de Newton Knight, soldado confederado que, durante a Guerra Civil, no século 19, resolve desertar por discordar com o ideário escravagista e sectário dos estados do Sul, formando uma milícia, da qual também fazem parte outros desertores, além de escravos, mulheres e até crianças. Sua intenção é fundar um estado independente.
Knight, em tempos de ascensão da direita nos Estados Unidos, com a eleição do republicano Donald Trump à Presidência do país, ganha a dimensão de um símbolo libertário. Rebela-se tanto em âmbito político quanto pessoal – casado, ele se apaixona por Rachel (Gugu Mbatha-Raw, de Belle), uma escrava com quem constitui uma família paralela à sua, com o consentimento de sua esposa, Serena (Keri Russell, da série The Americans).
A história do líder é contada simultaneamente a de um de seus descendentes, que, nos anos 60 do século 20, apesar da pele branca, é identificado como negro, por conta do sangue de Rachel que corre em suas veias. Ele é processado por se casar com uma mulher caucasiana, o que contrariava as leis segregacionistas da época.
Apesar da boa história, Um Estado de Liberdade arrasta-se em sua segunda metade. Poderia ter se beneficiado de uma edição mais enxuta. Não tem o impacto emocional de Snowden, que tem um poderoso desfecho com a presença do próprio Edward Snowden, também tema de Citizenfour (2014), vencedor do Oscar de melhor documentário.
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