Quando Um Lugar Silencioso foi lançado, em 2018, os produtores e o diretor John Krasinski, também um dos protagonistas do longa-metragem, não tinham ideia de que o filme se tornaria um dos grandes êxitos de bilheteria daquele ano ou que sua sequência seria lançada num outro mundo, em plena pandemia de Covid-19.
Um Lugar Silencioso – Parte 2, já um sucesso comercial onde estreou, retoma a trama exatamente do ponto inconclusivo em que o original terminou: Evelyn Abbott (Emily Blunt) e seus filhos, a surda Regan (Millicent Simmonds), Marcus (Noah Jupe) e um bebê, estão à deriva após a morte do pai das crianças, Lee (Krasinski). É cada vez mais difícil manter o silêncio, para não serem identificados pelas horripilantes criaturas de audição super sensível que invadiram o planeta. A família se tornou uma presa fácil, vulnerável.
Passados três anos desde a chegada aos cinemas do primeiro filme, ainda que a ideia original do roteiro não fosse essa, é inevitável relacionar o enredo dessa tensa e intensa sequência com o momento que estamos vivendo em 2021 e não enxergar no roteiro uma metáfora da doença. Os tais seres invasores, assim como o novo coronavírus, podem estar em qualquer lugar, à espreita, e basta que alguns cuidados não sejam tomados, como derrubar, gritar de dor ou deixar o celular tocar, para atiçar o predador. Algo como não usar máscaras, esquecer de lavar as mãos ou aglomerar.
No limite entre a ficção científica e o terror, a franquia O Lugar Silencioso é uma ode à família nuclear (pai, mãe e filhos) como unidade fundamental da sociedade, o que pode ser interpretado como uma opção conservadora.
Nesse aspecto, tanto a sequência como o original, para quem não o tenha visto antes, ganham outra camada de significados. De certa forma, a humanidade, em alguns países mais do que em outros, ainda está em situação semelhante à dos Abbott. Frágil, assombrada.
No limite entre a ficção científica e o terror, a franquia O Lugar Silencioso é uma ode à família nuclear (pai, mãe e filhos) como unidade fundamental da sociedade, o que pode ser interpretado como uma opção conservadora. No segundo filme, contudo, essa unidade está estilhaçada porque o patriarca foi morto no fim do longa anterior e agora cabe a Evelyn lutar pelo clã, saindo da proteção do lar e enfrentando o mundo externo.
Interessante também é o maior protagonismo assumido por Regan (uma pré-adolescente com deficiência vivida por uma atriz surda, a excelente Millicent Simmonds), que empreende a sua jornada do herói/heroína, se colocando em risco em nome da mãe, dos irmãos, da humanidade. Já não são os medonhos alienígenas o único grande risco.
É instigante a entrada em cena de Emmett (Cillian Murphy), amigo dos Abbott que também viveu duras perdas familiares, desempenhando o papel de uma espécie de outra figura paterna relutante e (muito) ambígua, brutalizada pela violência de tudo que acontece – ou pode ocorrer.
Krasinski, que aparece no filme em flashbacks, reafirma ser um diretor hábil e promissor, que explora os constrastes entre os silêncios e a fúria e vai além do susto pelo susto. Aguardamos seus próximos passos por trás das câmeras.
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