Depois de adaptar para as audiências americanas parte do universo da Era Shōwa em Godzilla: Rei dos Monstros (2019), a Legendary Pictures tinha a promessa de reinterpretar o maior embate de criaturas gigantes da história do cinema com Godzilla vs. Kong (2021). O filme, dirigido por Adam Wingard, chegou à HBO Max na semana passada, entregando um entretenimento eficiente, visualmente excitante e não muito preocupado com coerência narrativa.
Diferentemente das demais produções do chamado monsterverse, que teve início com a estreia de Godzilla (2014), a trama aqui abraça o legado sci-fi da franquia tokusatsu dos estúdios Toho. Sem muitas explicações, os personagens humanos visitam uma cidade perdida no centro da terra, usam naves militares ultra tecnológicas e criam robôs gigantes.
Kong sempre foi o espetáculo, um sinônimo de entretenimento cinematográfico. Godzilla é a metáfora cautelar sobre a força de destruição humana.
O foco da narrativa é Kong, o gorila gigante que vive na Ilha da Caveira, e que coloca sob risco o domínio do titã alfa Godzilla. O monstro é essencial para um plano maluco do núcleo humano da trama, em que uma empresa precisa de uma energia cósmica que existe na terra oca. O fiapo de enredo vira uma desculpa para a criação de imagens de cinema kaiju deslumbrantes, com pancadaria em navios e numa Hong Kong cheia de neon.
Há claros buracos no roteiro, com coisas mal desenvolvidas e personagens que parecem importante, mas não chegam a ter mais de cinco minutos de tela. Wingard disse em entrevistas que deixou trechos inteiros do núcleo humano na mesa de edição para privilegiar o visual. Em certos momentos, a obra parece uma colagem de cenas, em alguns momentos flertando com o experimentalismo. Na jornada para o centro do planeta, uma expedição liderada por Alexander Skarsgård e Rebecca Hall passa por um portal que evoca o jogo de luzes do último ato de 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1968).
Kong sempre foi o espetáculo, um sinônimo de entretenimento cinematográfico. Godzilla é a metáfora cautelar sobre a força de destruição humana. Essa dualidade é refletida no filme, visto que o gorila é um personagem cativante, com o qual nos relacionamos facilmente. O lagarto radioativo é um animal irritado e impaciente. A dinâmica funciona.
Curiosamente, há mais referências na trama à Godzilla vs. Megalon (1973) do que ao King Kong vs. Godzilla (1962) de Ishirô Honda. Wingard parece tentar se afastar do enredo barato do clássico da Toho, mergulhando em um ou outro conceito deixado pelos filmes anteriores da Legendary.
Obviamente feito para ser visto em telas grandes, Godzilla vs. Kong foi lançado simultaneamente para um serviço de streaming nos Estados Unidos por causa da pandemia do covid-19. Essencialmente visual, a produção perde um pouco da força em casa. Deixa uma impressão de que vê-lo numa sala de cinema o tornaria ainda melhor.