Quando apareceu pela primeira vez nas telas, King Kong foi literalmente apresentado como a oitava maravilha do mundo. Em 1933, o filme de Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack trazia contornos de metalinguagem ao exibir o gorila gigante como uma ambiciosa atração de circo. O espetáculo do monstro na ficção espelhava o deslumbre cinematográfico visto pelos espectadores no escuro do cinema.
Essa ideia, de uma criatura mal compreendida levada de sua terra para entreter audiências, esteve presente em praticamente todas as encarnações do personagem. Mesmo Godzilla vs. King Kong (1962) mostrava o primata como uma maneira de um produtor de televisão alavancar a audiência de uma emissora japonesa.
Kong: A Ilha da Caveira (2017), de Jordan Vogt-Roberts, é uma das poucas encarnações em live-action do gorila a ignorar a associação ao show business. A produção surge, na verdade, como uma tentativa de modernizar o monstro, apresentando-o para novas audiências. Ao mesmo tempo, o longa-metragem da Warner Bros. se encaixa dentro de um universo compartilhado iniciado por Godzilla (2014), de Gareth Edwards.
Apocalypse Now (1979) é uma referência direta para a obra. Alguns dos melhores momentos da narrativa dialogam com imagens do longa de Francis Ford Coppola.
A trama se passa em 1973, durante o fim da Guerra do Vietnã. Depois que a Ilha da Caveira é descoberta por satélites americanos, um pesquisador chamado Bill Randa (John Goodman) solicita recursos do governo para explorar o local em nome da sua organização, Monarch – a mesma liderada por Ken Watanabe no filme de 2014.
Para compor a equipe de expedição, Randa solicita o apoio de uma tropa militar. Os soldados estão sob o comando de um coronel chamado Preston Packard (Samuel L. Jackson), que não superou o fim da guerra e está em busca de um novo inimigo. A informação é importante porque assim que a tropa entra na ilha e encara a fúria de um gigantesco gorila, o personagem encontra seu antagonista.
Nessa dualidade entre Packard e Kong reside a força alegórica do filme. Pensado originalmente como uma trama situada em 1917, a mudança temporal deu ao filme um tom bastante metafórico sobre a guerra do Vietnã. O roteiro não é nada sutil nessa mensagem, inclusive, citando o trauma dos Estados Unidos em perder o conflito para os vietcongues em pelo menos duas ocasiões.
Apocalypse Now (1979) é uma referência direta para a obra. Alguns dos melhores momentos da narrativa dialogam com imagens do longa de Francis Ford Coppola. Tal qual a cena inicial dos helicópteros, aqui embalada com rock and roll. Vogt-Roberts vai além e constrói belos planos de contraste entre o aparato militar e o gorila gigante.
Kong não é o único monstro do filme. Seus principais antagonistas são criaturas reptilianas, chamadas de skullcrawlers. Assim como em outras encarnações do monstro na tela, A Ilha da Caveira também tem insetos gigantes, mamíferos estranhos e outras esquisitices.
O longa funciona como um bom entretenimento sem ser muito memorável. Além de Goodman e de Jackson, também estão na fita Brie Larson, Shea Whigham, Tom Hiddleston, Toby Kebbell e Richard Jenkins. Nenhum deles tem muito o que fazer na trama. A exceção é John C. Reilly, que vive um soldado da Segunda Guerra Mundial que foi esquecido na ilha com um inimigo japonês. É dele que vem o histórico de Kong como um solitário e incompreendido protetor da Terra. Ideia que será utilizada em Godzilla vs. Kong, previsto para estrear em março deste ano.