Duncan tem uma profunda dificuldade em lidar com estresse. No trabalho, vive assumindo responsabilidades que não cabem à sua função. A mãe o submete a constantes humilhações nos jantares de família. A esposa o pressiona para que tenham um filho. Como resultado, sofre de intensas dores na barriga. Uma dia, a penúria faz nascer um pequeno monstro assassino, chamado de Milo.
Essa é premissa de Bad Milo! (2013), um filme bem bobo dirigido por Jacob Vaughan e produzido pelos irmãos Jay e Mark Duplass. A produção brinca com a ideia de que a sociedade pode nos matar com o excesso de cobranças, as interações forçadas e a repressão de sentimentos. A criatura deixa o corpo do protagonista para matar aqueles que o encurralam no seu cotidiano.
No livro Monster in the Movies, o cineasta Joe Dante explica que toda monstruosidade no cinema é uma metáfora. A presença de uma deformidade na tela aponta para algo que não é dito. Às vezes, pode ser a representação de um sentimento, como o de que a sociedade americana está corrompida por interesses religiosos podres e patriarcais, como em Hereditário (2018). Em outros casos, pode ser um alerta sobre algum comportamento humano, como despejo de poluentes químicos nos rios de O Hospedeiro (2006).
Bad Milo! é uma das poucas produções que parecem literais demais na alegorização da correria do dia a dia. O Experimento Belko (2016), de Greg McLean, discute um tema parecido ao colocar os personagens, um grupo de trabalhadores de uma filial de uma empresa norte-americana na Colômbia, para se matar pelo direito de ver a família. A trama, no entanto, carece de um elemento bem grotesco.
No livro Monster in the Movies, o cineasta Joe Dante explica que toda monstruosidade no cinema é uma metáfora. A presença de uma deformidade na tela aponta para algo que não é dito.
Milo, o monstro, consolida nossas angústias do cotidiano. É ele quem faz sangrar aqueles que nos oprimem e resolve, com violência, a fonte de nossa raiva. Só podemos controlá-lo quando entendemos que é preciso tratamento para aliviar o estresse – muitas vezes com a ajuda de um especialista (papel de Peter Stormare na obra).
Os Filhos do Medo (1979), de David Cronenberg, lida com um tema muito parecido. A história acompanha um pai de família, que se sente alienado da esposa, internada em uma clínica especializada em externalizar os problemas emocionais. Quando os pais dela são assassinados por estranhas criaturas que parecem crianças, o protagonista começa a desconfiar que o terapeuta da mulher está envolvido.
No fim da trama, descobrimos que é ela quem dá luz à própria raiva. Os monstrinhos são manifestações físicas, paridas de seu próprio corpo como filhos, do que a incomoda na psique. De forma bem eficiente, Cronenberg cria uma reflexão sobre como o mundo contemporâneo (na política, na economia e nas interações humanas) pode nos deformar, impondo regras, regulando e restringindo comportamentos. O diretor está dizendo que estamos doentes. Mensagem que parece não ter mudado muito desde o fim da década de 1970.