Como em muitas casas com mães e filhos pequenos, aqui a porta do banheiro – em geral – segue aberta. O que se perde de privacidade é pequeno diante da tranquilidade da criança que não perde os pais de vista. Aí que, nessa, temos altos papos e conversas escatológicas sobre as necessidades fisiológicas de cada e de todos – o que acho ótimo, porque o universo me livre de cocô ser tabu para as pequenas.
Se a média é que uma vez por mês as mulheres menstruam e sangue não é muito uma coisa que se vê no dia a dia, é claro que aquela cena do absorvente causou espanto nas pequenas. “O que a mamãe usa é como se fosse uma ‘fralda’, porque todo mês sai esse sanguinho aqui, de dentro da mamãe, mas tá tudo bem, não dói, etc etc”.
Usar a palavra fralda foi na tentativa de relacionar com algo do cotidiano delas, mas é claro que na primeira oportunidade, em tempo não pandêmicos, a criança no carrinho do supermercado fala para a moça do caixa: “sabia que estamos comprando a FRALDA da mamãe? Ela usa FRALDA”, repetiu a pestinha, soltando uma gargalhada sincera.
Mas sempre que me flagram nesses dias é aquela surpresa. “Mas o que é isso mesmo?? Como é o nome??”, perguntam os olhinhos curiosos. “Quer dizer que quando eu crescer eu também vou ter isso? Também vou usar a ‘fralda’?”, perguntam.
A normalização da menstruação se dá pelo fato de que as crianças e aquele sangue vem do mesmo lugar, portanto, um honra a existência do outro.
Acho que o fato de falar abertamente sobre o assunto já é uma evolução. Na minha casa – e da maioria das outras mulheres – falar da menstruação sempre foi um tabu.
É recente o movimento de desmistificação desse ciclo natural. Por isso, o livro A Mamãe Sangra (2020), da escritora curitibana Claudia Pacheco e ilustrado por Bruna Meyenberg Fraga – que, mesmo depois do lançamento da obra, mantém site e páginas nas redes sociais com informações sobre o tema.
A obra narra a surpresa de um menino de 4 anos com a mãe menstruada e usando um coletor menstrual. A história do livro dá umas pinceladas sobre o que é a menstruação e se concentra no que parece ser a vivência da autora, que fala sobre plantas e gravidez também.
O livro é acessível e muito bem ilustrado. Destina-se ao público entre 2 e 10 anos; no entanto, acredito que mesmo as crianças grandes precisam de apoio na leitura da obra, que tem muitos elementos que precisam de “tradução” para os pequenos. Em alguns momentos, o texto foge do elemento lúdico, mais comuns nos livros para essa faixa etária.
A normalização da menstruação se dá pelo fato de que as crianças e aquele sangue vem do mesmo lugar, portanto, um honra a existência do outro.
Não encontrei outras obras para o público infantil que tratem do mesmo assunto, portanto, vale o ineditismo e para ter a obra como âncora para falar de menstruação.
É claro que um assunto que ainda é tão tabu não seria completamente desmistificado na primeira obra sobre ele. Mas se não existe a primeira, não existirão outras, então A Mamãe Sangra cumpre um papel honroso na biblioteca das minhas pequenas mulherzinhas.
A MAMÃE SANGRA | Claudia Pacheco
Editora: Arte;
Tamanho: 20 págs.;
Lançamento: Janeiro, 2020.