Estou, neste momento, em Joinville, no XVI Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul. Ontem, após apresentações em um grupo de trabalhos sobre jornalismo, iniciou-se um debate no qual um professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) abordou uma questão que, no meu olhar, é muito pertinente: somos insubstituíveis por qualquer tecnologia em virtude de nossa formação humanística.
Quando tinha 18 anos, entrei em contato pela primeira vez com o Discurso Sobre o Método, tratado matemático e filosófico elaborado por René Descartes em 1637. Discours de la méthode pour bien conduire sa raison, et chercher la vérité dans les sciences ou Discurso sobre o método para bem conduzir a razão na busca da verdade dentro da ciência. Explicando-o de forma resumida: o tratado propunha um modelo quase matemático na forma de conduzir nossos pensamentos, uma vez que esta ciência tinha por característica a ausência de dúvidas.
Em sua obra, Descartes permeia a autoridade da razão, segundo a qual o conhecimento só pode ser atingido pela razão, tornando, desta maneira, as percepções de mundo descartáveis. Uma das frases mais marcantes do tratado (e constantemente traduzida de maneira equivocada) é “Je pense, donc je suis”; em português “penso, logo sou”. Por muitos anos, esse tratado guiou, de forma muito confusa, é claro, meus pensamentos.
Nesses dias em que a escrita, além de prazer, tornou-se um hábito, reencontrei-me com pequenos momentos de conflitos entre razão e sentido. Hoje, fica um pouco mais difícil imaginar a possibilidade de não levar minhas percepções de mundo em consideração durante a formulação de minhas razões.
“Nesses dias em que a escrita, além de prazer, tornou-se um hábito, reencontrei-me com pequenos momentos de conflitos entre razão e sentido.”
Passei ao método “ler/pensar/refletir/transformar”. Lembro de quando mais jovem, na época que morava no Recife, ler uma revista chamada Ultimato. Em uma das edições, havia uma reflexão final que foi mentalmente gravada. Versava sobre, é claro, visões de mundo. No lugar mais escuro, a visão mais clara; no lugar mais apertado, a visão mais ampla, e no lugar mais solitário, a visão mais solidária. O autor, logicamente, se valia de nossa própria contradição de existir para ser contraditório nas palavras. Era uma provocação à busca pelo autoconhecimento, o que ele conceituava como interface de um processo.
De tudo isso tirei a certeza (talvez algo elaborado pela minha razão flertando com minhas percepções de mundo?) que não podemos nos voltar apenas para as relações verticalizadas. A formação humanística de nosso agir/pensar deveria (e deve) ser o guia para as relações horizontais, aquelas feitas de você à pessoa ao lado. Nas certezas que encontrei na vida, a importância do duplo conhecimento, de nós mesmos e do próximo, reaproxima, traz esperança, muda a nossa visão e nos traz à tona transformados.