Entraram no quarto.
– Mas nem fodendo que esse é o quarto que a gente viu no site!
– É só pra uma noite, amanhã a gente tá em casa.
– QUATRO estrelas. Quatro. A gente tá pagando por um hotel com quatro estrelas. Você tá vendo essa cama? O lençol deve ser o mesmo desde 1920. Deveria ser quatro estrelas naquela época.
– Os gemidos de sexo selvagem rolando no quarto ao lado me parecem bem atuais.
– É de isopor essa parede? De folha sulfite?
– Se não tivessem roubado o nosso carro, eu ia falar pra gente dormir no carro. Que dia.
– E essa goteira bem na cama?
– Coloca aquele balde ali em cima.
Deitaram e ligaram a TV. O balde no meio dos dois.
– Coloca um filme bem alto aí pra cobrir o pornô ao vivo, vai.
– A gente pode se distrair vendo leilão de boi? É o único canal que pega.
– Eu queria muito morrer.
Duas horas se passaram.
– Eu compraria esse boi. Achei bonito.
– Gostei mais do anterior, o marrom.
– Dá o telefone aqui, eu vou dar um lance.
– Quê? Claro que não! A gente não vai comprar um boi.
– Olha só: a gente foi assaltado no meio de uma cidade no cu do mundo, com 30 habitantes, e tudo o que a gente tem é o celular, o cartão, a roupa do corpo e a esperança de que amanhã o seu amigo vai mesmo vir nos salvar. A gente merece comprar um boi se a gente quiser, Roberto.
– Cris, você tá se ouvindo? Acabamos de ser assaltados!
– Mas só levaram o carro, o cartão de crédito tá aqui. A gente tá querendo um bichinho há tanto tempo.
– Não vou discutir, vou tomar um banho.
– Só reflete: se a gente tivesse vindo de boi ao invés de vir de carro, a gente não teria sido assaltado. Nada disso estaria acontecendo.
– Tá bom, vou refletir no banho.
Entrou no banheiro e deu um grito.
– O QUE ACONTECEU, ROBERTO?
– A água tá preta! Liga na recepção.
Ligou.
– Roberto, disseram que é assim mesmo, mas é limpinha.
– Devo acreditar?
– É claro que não, volta pra cá.
– Puta que pariu de dia.
Só reflete, se a gente tivesse vindo de boi ao invés de vir de carro, a gente não teria sido assaltado. Nada disso estaria acontecendo.
Depois de mais alguns bois, finalmente dormiram.
Acordaram com o sol e a brisa da manhã entrando pela janela. E um bicho horrível parado ao lado da cama.
– MEU DEUS DO CÉU, O QUE É ISSO?
– É UMA RATAZANA!
Ouviram um senhor, do lado de fora da porta, “é a Joana! Ela não morde, não, tá sempre aqui. O café da manhã já foi servido, senhores”.
Olharam-se.
– Eu só quero que tudo isso acabe!
– Eu sei.
– E que não aconteça nunca mais!
– Eu sei.
– O que a gente faz?
– Cris, fica calma. Quando chegar em casa, a gente vai comprar um boi.