Gente que fala alto em público sem ter muito o que dizer, e canta pneu em plena luz do dia, no meio da cidade, também insiste em negar que a Amazônia está em chamas. Faz total sentido! “É intriga da oposição, da nossa imprensa vermelha, desses europeus que desejam roubar nossa riquezas naturais e não querem que a gente cresça e apareça!”, repetem eles como um mantra, duvidando do The New York Times, do Le Monde, do Guardian, porém acreditando nas verdades que recebem pelo WhatsApp: “Viram a esposa do Macron? É feia e velha. Por isso que ele é mal-humorado. Tem inveja do nosso, que tem mulher jovem e bonita”.
Esse tipo de pessoa, capaz de afirmar, na cara dura, que homens e mulheres em situação de rua estão ali porque querem e “gostam da vida fácil”, dá de ombros para os males do mundo, ou simplesmente vira a cara, fingindo não ver. “Deus ajuda quem cedo madruga!”, afirma sua ética do trabalho seletiva, que muitas vezes não se aplica a eles mesmos, ou aos seus filhos queridos. Estes, sim, merecem acordar tarde, “chegar lá” pelo caminho mais curto. São “pessoas de bem” e, portanto, têm direto aos atalhos, ao lugar ao Sol que lhes é de direito. Quem sabe cheguem a embaixadores, fritando hambúrgueres.
Gente que fala alto em público sem ter muito o que dizer, e canta pneu em plena luz do dia, no meio da cidade, também insiste em negar que a Amazônia está em chamas. Faz total sentido! ‘É intriga da oposição, da nossa imprensa vermelha, desses europeus que não querem que a gente cresça e apareça!’, repetem eles como um mantra, duvidando do The New York Times, do Le Monde, do Guardian, porém acreditando nas verdades que recebem pelo WhatsApp.
Ouvi outro dia, em um rabo de conversa, que se há algo de positivo no momento pelo qual o país passa hoje, tempos de polarização, de enfrentamento, é o cair das máscaras. Sempre foi assim, apenas tiraram o véu meio transparente e já bastante puído que ocultava os abismos não apenas sociais, mas também ideológicos e de valores fundamentais. Agora que encontraram um messias que lhes legitima os preconceitos, a ignorância, sentem-se empoderados, cornos em riste, orgulhosos. São gado sagrado, escolhido por Deus. O resto é bom para o abate, pro churrasco de sábado, alvo para sniper – estrangeirismo que veio pra ficar em nosso vocabulário tupiniquim num momento de endeusamento da arma de fogo, da truculência como norma cotidiana de resolução de conflitos.
Um vizinho que nunca cumprimenta ninguém no elevador gosta de cantar pneu para sair da garagem. Fala alto diante do prédio com os amigos, para a vizinhança toda ouvir. É seu canto de masculinidade performática. Tem o mito estampado numa camiseta preta, que faz lembrar o traje típico do fascismo nos tempos de Benito Mussolini, e mora com os pais. Já passou dos 35 anos.