Há quem ainda acredite no mito de que Curitiba é a capital de um Brasil diferente, branco e europeu. Não é, e provavelmente nunca foi, por mais que muitos de nós sejamos descendentes de imigrantes do Velho Continente, que com certeza ajudaram a moldar a identidade local, bem mais multicultural do que essa imagem inventada.
Nas cercanias do seu Setor Histórico, a poucas quadras do Largo da Ordem, Curitiba guarda um pequeno tesouro abaixo do nível da calçada, à Rua Jaime Reis, no bairro São Francisco, exatamente defronte à Cúria Metropolitana, sede da Igreja Católica na cidade. Trata-se do clube de samba Quintal da Maria (o nome soa no mínimo poético, dada essa sua estratégica localização).
O muro decorado com pinturas coloridas pouco ou nada revela do local, cuja entrada é vigiada por um segurança engravatado e de estatura algo intimidadora. Ele se encarrega, com toda a cordialidade, de revistar os clientes. Degraus estreitos, de uma escada bem inclinada, levam até o misto de bar e casa de shows, que parece nos transportar, como um portal, a um pedacinho do Rio de Janeiro, escondido em pleno coração curitibano, a bater ao som da percussão de formações de samba que fazem os presentes chacoalhar seus esqueletos como podem, ou conseguem.
Há quem apresente legítimo samba no pé, evoluindo com graça e sincronia, embalado pelo repertório do local, que vai do pagode do grupo Fundo de Quintal a clássicos de Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Nelson Cavaquinho e Chico Buarque. Mas não faltam empolgados turistas acidentais, que acompanham à sua maneira o ritmo da música, ensaiando passos desengonçados de pop-rock, axé e até reggae. Ninguém está nem aí, no entanto, porque a alegria é esfuziante ali.
Nas cercanias do seu Setor Histórico, a poucas quadras do Largo da Ordem, Curitiba guarda um pequeno tesouro abaixo do nível da calçada, à Rua Jaime Reis, no bairro São Francisco, exatamente defronte à Cúria Metropolitana, sede da Igreja Católica na cidade. Trata-se do clube de samba Quintal de Maria (o nome soa no mínimo poético, dada essa sua estratégica localização).
Algo chama muita atenção, à medida em que, com o cair da noite de um domingo chuvoso, o lugar vai lotando, com uma fila quase permanente, que se inicia lá no alto, já na calçada: a diversidade. Embora não sejam maioria, os negros vão aos poucos gahando mais e mais visibilidade no ambiente, quase todos cantando e sambando com entusiasmo todas as canções do repertório do conjunto, de excelente qualidade.
Um senhor mulato, idoso, chama a atenção. Com um traje mais formal, camisa, calças e sapatos sociais, além de um elegante chapéu, ouve, muito atento, a música, acompanhando o ritmo com palmas entusiasmadas sem sair do mesmo lugar. Está parado numa inclinação no terreno que lhe permite ver o público dançante e o palco do alto. Sua concentração e felicidade são notáveis.
Em determinado momento, é inevitável a epifania: Curitiba, à sua maneira, sabe sambar, sim, porque ali, naquele pedaço escondido da cidade, ela se mostra múltipla e plena, pulsante e em constante pulsação. Não é, pelo menos não ali, uma cidade inventada.