E se o tempo parasse? Isso nunca vai acontecer, todos sabemos. Mas bem que poderia! Ainda que fosse por algumas horas, que ficassem guardadas em lugar seguro, não aprisionadas, mas em repouso, à espera de um eventual instante de despertar, no fundo do mar.
Poderiam repousar em uma caixa, ou talvez num frasco, que pudessem ser abertos com cuidado para que experiências e sensações se misturassem lentamente ao ar e nos levassem de volta àqueles momentos em que fomos, em essência, nós mesmos. Intensamente. Seria, imagino, uma espécie de transe, não exatamente uma viagem ao passado, mas, sim, o desembarque de uma parte muito preciosa dele no presente. Como se fosse um visitante para uma breve visita, ou um encontro amoroso entre as árvores de um parque ou num quarto de hotel.
E se o tempo parasse? Isso nunca vai acontecer, todos sabemos. Mas bem que poderia! Ainda que fosse por algumas horas, que ficassem guardadas em lugar seguro, não aprisionadas, mas em repouso, à espera de um eventual instante de despertar, no fundo do mar.
São tão raras as experiências nas quais temos a licença, ou conseguimos, apenas ser, que entregá-las ao senhor tempo é quase injusto, mesmo que inevitável. Viril, ele é um trem que segue em via única, sem retorno, levando consigo, nos seus vagões infinitos, bem, mal e tudo mais que houver, sem direito a retorno. Fantasio, então, de nele criar uma cabine mágica, onde olhares, conversas, toques, lágrimas, beijos, filmes, livros, seriados, shows, abraços, declarações de amor, risos, cães, viagens, sorrisos de criança, luas cheias, mãos dadas e tudo que nos torna encantados ali ficassem a seguir seu caminho com a promessa de uma volta, ainda que efêmera.
À medida em que o tempo avança em sua jornada inclemente, sem retorno, alguns de nós acumulam mais ou menos saudades, que podem tanto nos acariciar quanto machucar. Há, no entanto, os mais desprendidos que as deixam partir sem tanto penar. Encantam-se com o apito do trem, o som forte de suas rodas sobre os trilhos, a certeza potente de sua existência e constância, e não se sentem roubados, porque também se percebem um tanto passageiros: um bocado de suas vidas, afinal, já foi despachado e está a bordo.
Volto então à ideia de um futuro quando os escafandristas possam encontrar no fundo do mar essas caixas ou frascos com pedaços encapsulados de nós e façam a descoberta de como era, enfim, ser feliz. E talvez não soubéssemos tão bem e, por isso, resolvemos guardar para não esquecer.