Lembro bem desse dia. A professorinha da nossa turma de segunda série trouxe uma série de copos e bacias e garrafas de água e velas para fazer experiências introdutórias aos princípios físico-químicos, um exercício que dificilmente despertaria a atenção de qualquer criança que não estivesse consciente, em primeiro lugar, de que os elementos obedecem a princípios naturais. Pelo menos romperia o marasmo de mais uma aula clássica – explicativa, teórica, enfastiante, soporífera – então tudo bem.
Tudo ia mais ou menos bem até que ela apanhou um copo de vidro transparente e colocou por cima de uma vela acesa. A vela aguentou mais dois ou três segundos e então se apagou, devido à ausência de oxigênio para ser consumido no ambiente, como nos foi explicado em seguida. Algo naquela experiência despertou o meu fascínio. O fogo, tão indomável, tão selvagem, destrutivo e caótico, era humanamente dependente de oxigênio como nós. Mais: o fogo era parte oxigênio, parte matéria e parte energia, e isso era muito difícil de entender. Ainda é.
A partir desse dia, poucas coisas me causaram mais fascínio do que o fogo. Quando tive autorização dos adultos para manusear isqueiros e fósforos, minha vida mudou. Passei um ao e meio de minha vida tentando atear fogo em tudo o que via pela frente, para ver como as coisas se transformavam e se comportavam enquanto eram consumidas pelas chamas. Fiz incontáveis fogueiras e fui parar na delegacia um par de vezes. Até hoje aprecio maravilhado a queima de fogos do ano-novo, e na virada desse ano, presenciei o céu de Copacabana explodindo em 16 minutos de explosões ininterruptas. Foi um espetáculo repleto de emoções baratas e, ao mesmo tempo, uma das experiências mais intensas da minha vida.
O fogo, tão indomável, tão selvagem, destrutivo e caótico, era humanamente dependente de oxigênio como nós.
Meus pais em algum momento me colocaram frente a um psicólogo para tentar entender por que eu precisava botar fogo em tudo. E a verdade é que, assim como a experiência da escola, até hoje não consigo entender direito o fogo, mas descobri por esse caminho, como muitas outras pessoas, que nem sempre é preciso entender, resolver e analisar algo para apreciá-lo com gosto. Queria que minha primeira crônica do ano fosse como meu gosto pelo fogo: sem explicação, sem propósito, vulgar e simplesmente assertiva. Apenas gosto do fogo. Fogo anda comigo. E isso me basta.