Em uma das obras mais irritantes que a música pop já foi capaz de produzir, o cantor James Blunt vê, em um metrô lotado, uma menina muito bonita que, apesar de estar acompanhada, não se privou de dar uma flertadinha de leve com o menestrel da voz fina. Basta um sorriso para que Blunt se comportasse como um adolescente virgem e dedicasse uma canção inteira a essa compulsiva paqueradora do transporte público. Uma espécie de Werther que só fez faculdade pra agradar o pai, Blunt se derrama em lamentações de não realização de seu amor platônico e se deprime de perder o sono, ainda que negue seu desespero na primeira estrofe, afirmando ter um plano. O plano dele, na verdade, é chorar em falsete e descabelar o palhaço pela mulher do próximo – uma atitude comovente só quando você é muito bonito, o que não é o caso.
Com a sensibilidade poética de um porco com escoliose e a eloquência de uma banana, o imbecil repete “você é bonita” 32 vezes e jura que o que diz é verdade, na tentativa de ser ainda mais enfático. O vídeoclipe retrata a si mesmo depositando seus tênis e as coisas do seu bolso em uma fileira à sua frente, depois de tirar a camisa para então se atirar de uma plataforma em direção ao mar, em um gesto que demonstra abandono, sugere suicídio e atesta egolatria, mas que, ao fim e ao cabo, é apenas tão desconexo e desnecessário quanto sua própria música — que, aliás, vende como água e toca sem parar em trilhas de novelas, filmes, casamentos, restaurantes self-services e demais situações que peçam emoções controladas e instrumental morno. Não demora muito para que “You’re Beautiful” se torne um ícone da mediocridade de nosso tempo, um recibo da nossa sociedade desinteressante e um sintoma do nosso desespero por sentido na liquidez baumaniana de nossos dias. Blunt se agarra à sua música chocha como se agarra ao sorriso da desconhecida, carregando água na peneira, quixotescamente inapto tanto para escolher suas batalhas quanto para vencê-las.
Com a sensibilidade poética de um porco com escoliose e a eloquência de uma banana, o imbecil repete ‘você é bonita’ 32 vezes e jura que o que diz é verdade, na tentativa de ser ainda mais enfático.
E o que acontece com o objeto de paixão da música? Bem, o namorado da Messalina do metrô detesta aquela vozinha chata dizendo que não sabe o que fazer, e ela sorri por dentro de satisfação, porque sabe que essa música pentelha só existe por causa dela. Pra ela, James Blunt não é um Werther com patente militar, é o maior dos homens, sensível aos detalhes na medida certa. Blunt continua com um plano para não perder o sono, mas não conta a ninguém que não leia nas entrelinhas.