É costume dizer que quando uma história nos prende, devoramos o livro vorazmente. Contudo, há certas leituras que pedem mais comedimento, para uma apreciação mais satisfatória. Foi o caso de Kaki (Blanche, 2015), do poeta curitibano Alvaro Posselt. Composto por 56 haicais – poemas de três linhas de origem japonesa –, a obra nos leva a enxergar a beleza da simplicidade.
Se lido de uma vez, a sensação é de que esse Kaki não passou de uma degustação e a fome ainda prevalece. Foi só com uma segunda leitura, parcelada ao longo da semana, que pude compreender e apreciar todos os sabores que me eram oferecidos.
Se a poesia em geral já é uma literatura que pede uma atenção especial, o haicai, pelo seu tamanho diminuto, pede um cuidado ainda maior, para que o leitor não só leia, mas, principalmente, compreenda o significado daquela mensagem.
Como bem destaca José Marins, na apresentação da obra, o haicai é como uma fotografia: a captura da instantaneidade. E Posselt, como bom “fotógrafo”, tem o olhar treinado e a sensibilidade para revelar o encanto do cotidiano.
“Repleta de inseto
a casa tem um par de asas
em cada objeto.” – (página 69)
Com muita leveza, Posselt brinca com a linguagem para a construção das rimas, fazendo troça até de si mesmo.
Esse traço se revela em toda a trilogia, iniciada com Tão Breve Quanto o Agora (2012), seguida por Um Lugar Chamado Instante (2013) e finalizada com Kaki, na qual o autor faz uma homenagem à origem oriental do haicai. Inclusive, os títulos das duas primeiras obras destacam a necessidade de se estar atento ao presente.
Outro traço característico da obra do autor é o humor. Com muita leveza, Posselt brinca com a linguagem para a construção das rimas, fazendo troça até de si mesmo:
“Estou ficando calvo
O tempo acertou
o Alvaro no alvo.” – (página 64)
O humor também se junta ao carinho pela sua terra natal. Curitiba e seus traços ganham destaque em diversos poemas, seja pelo clima inconstante ou pelos ipês amarelos característicos da capital. Quem nunca passou pela Travessa da Lapa, no centro da capital, e se deparou com o poema “Curitiba não nos poupa/ ontem tomei sorvete/ hoje tomo sopa”?
À irreverência do autor, soma-se a sua habilidade com as palavras e com o domínio das diferentes técnicas do haicai. Só no Brasil, são cinco estilos diferentes: haiku japonês, guilhermino, livre, clássico e senryu. Alvaro é versado na maioria desses estilos, mas não se prende a nenhum. Deixa a inspiração chegar e produzir seus frutos livremente.
[box type=”info” align=”” class=”” width=””]KAKI | Alvaro Posselt
Editora: Blanche;
Tamanho: 80 págs.;
Lançamento: 2015.[/box]