Comandada por Lilia Schwarcz, a mesa “Briviário do Brasil” proporcionou que o público presente em Paraty ouvisse o que pensam dois autores brasilianistas. Benjamin Moser e Kenneth Maxwell fizeram desta uma das melhores mesas até o presente momento, mostrando desenvoltura ao tratar de temas que nos são tão caros – como o processo de deposição de Presidenta Dilma Rousseff. O distanciamento existente entre eles e o país proporciona um olhar menos (ou nada) carregado de nacionalismo, como o próprio Moser citou em sua fala.
“Como estrangeiro, eu acho que tive muito vantagem disso. As pessoas ficam curiosas de como o estrangeiro enxerga o Brasil. Tem interesse. Mas do outro lado tem um ressentimento com o estrangeiro”, comentou o autor da biografia de Clarice Lispector, Clarice, uma biografia (Cosac Naify, 2009). Sua relação com a homenageada da Flip de 2015 também veio à tona. “Essas paixões adolescentes nem sempre ficam, mas a Clarice grudou, até hoje, e deu no que deu”, disse Benjamin.
Maxwell, autor de A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal 1750-1808 (Paz e Terra, 2009), também comentou nosso momento político e sobre o que chamou de “processo de transição cujo destino não está claro”. “Há muitos brasis. O Brasil oficial, de Brasília, e um Brasil da favela, da classe média, o Brasil de Pernambuco, de Minas. É difícil explicar o Brasil num total”, disse, fazendo questão de deixar claro que sua preocupação vai além de nossa terra. “Não estou preocupado só com o impasse político do Brasil, mas com o mundo todo.”
‘Ele deu uma ideologia estrutural para defender que o Brasil deu certo na questão racial. Mas não tem negros aqui’.
Brasil e a corrupção
A corrupção também esteve no centro do debate desta manhã. Entre críticas ao governo do interino Michel Temer e às políticas raciais, Benjamin Moser e Kenneth Maxwell saíram ovacionados da mesa.
“Não sei se é a primeira vez [que corruptos têm sido presos]”, disse Moser. Ele também fez duras críticas ao trabalho de Gilberto Freyre, especialmente na questão racial no Brasil. Segundo o escritor, Freyre criou uma tese que acoberta a desigualdade racial no país. “Ele deu uma ideologia estrutural para defender que o Brasil deu certo na questão racial. Mas não tem negros aqui”.
Para Maxwell, nosso momento enquanto país e sociedade é crítico. “Tenho a impressão de que o Brasil está num momento muito crítico. Um momento de típica transição brasileira”, sendo complementado por Benjamin: Quando a estrutura da sociedade não é estável, quando as instituições são fracas, a tristeza vem depois, e nós estamos vivendo um momento muito triste, o Jaburu está de volta”, em menção ao presidente interino Michel Temer.
Brasil, um país nacionalista?
“Brasileiros são muito nacionalistas. Machado de Assis já disse que aqui tudo veste as cores do país. Tudo tem que ser em função de ser brasileiro ou não. A gente recebe perguntas do tipo ‘como você pode gostar de Elizete Cardoso não sendo brasileiro?’, então o discurso nacionalista, aqui, é mais forte que na Europa”, apontou Moser.
Provocado por Lilia sobre a “síndrome de vira-lata” do brasileiro, o norte-americano foi enfático. “Vira-lata é o outro lado do nacionalismo. O brasileiro não deveria se sentir assim. Não somos isso, não somos o que está em nosso passaporte. O Brasil faria bem de ver indivíduos e não monumentos, caricaturas. Essas figuras de pedra. [Seria importante] ver os indivíduos. Não somos muito diferentes”.