Hoje gostaria de escrever um texto sobre uma tradição literária distante, milenar e a respeito da qual tenho pouquíssimo (próximo a zero, leia-se) conhecimento: poesia japonesa clássica.
Para tanto, escreverei, em linhas muito gerais, sobre uma coletânea de poemas traduzidos recentemente lançada, a obra Jûsan’nin Isshû: treze poemas do Ogura Hyakunim Isshû (2018, editora Urso), que conta com a tradução, direta do japonês clássico, de Vladine Barros.
Na edição, há que se elogiar várias coisas: o livro é belíssimo, um projeto gráfico elegante. Dentro deste belo presente, encontraremos, além dos treze poemas, um trabalho, à guisa de apêndice, sobre a literatura do período Heian (momento histórico em que foram escritos os poemas, autoria de Vladine Barros) e um prefácio de autoria da professora doutora Márcia Namekata (UFPR). Em ambos, o leitor encontrará rica fonte de informações que o auxiliarão na aventura com os brevíssimos poemas. Ademais, poderemos nos deparar com um elegante texto sobre “aquele gosto peculiar que se destaca”, assinado por Lua Bueno Cyríaco.
Mas a advertência do poema é que o tempo é um senhor implacável e o outono (o fim da vida?) chega para todos.
Aos poemas!
A forma dominante é o tanka, poema curto de 31 sílabas. Esta forma, a que Zbigniew Herbert já chamou de “venerável” é anterior à forma mais conhecida por nós, brasileiros (e ainda mais curta): o haiku. O prefácio nos informará que esta forma era mais afeita a expressar sentimentos, ao passo que o haiku era mais imagético/ pictórico.
Os poemas são acompanhados por notas explicativas que dão conta de diversos procedimentos linguístico-literários presentes nos poemas (chamo atenção à “palavra travesseiro” e ao trocadilho). Palavra travesseiro me parece um portmanteau muitos séculos antes das loucuras de Lewis Caroll. Esse tipo de procedimento, aliado às peculiaridades da escrita ideográfica “híbrida” que é usada no japonês, causa um tipo de sensação, ao leitor, que a se faz pouco afeita à tradução. Os irmãos Campos já haviam notado isto, não digo nada de novo.
Compartilho com vocês, além da vivíssima recomendação do livro, um poema que me causou profunda impressão:
“Quando vejo a lua sou tomado por mil coisas
que me entristecem.
No entanto, não foi apenas para mim que o
Outono chegou”.
Seu autor é Ôe no Chisato.
Gostaria de entender como um poeta se entristece ao olhar a lua de outono. Talvez seja a soma do seu brilho ao vento frio e as folhas caindo… é, deve ser isso. Mas a advertência do poema é que o tempo é um senhor implacável e o outono (o fim da vida?) chega para todos. Tudo é impermanente. Não devemos ser inocentes e achar que ele não virá para nós, pois virá. O nosso consolo é que virá para todos e virá com a naturalidade da lua que nasce.
Resta, minhas caras e meus caros, que nos preparemos para estes dias de outono.