Uma das características mais fortes da literatura paranaense é justamente a falta de uma característica. Apesar de muitos movimentos literários terem influenciado os paranaenses, eles atraiam com a mesma velocidade que desinteressavam. Mas, para quem está achando que isso é ruim, longe disso. Fruto dessa independência artística, são escritores que transpuseram a linha da escrita e oferecem uma literatura única.
Um exemplo dessa singularidade e um destaque entre os escritores de sua geração é o curitibano Otavio Linhares. Sempre ligado ao meio artístico, foi da música ao teatro, passando pelo cinema e abrindo espaço para a literatura. A preferência por cada área depende do momento de inspiração. Mas nos últimos anos, a dedicação parece ter pendido um pouco mais para o lado das letras. Nos últimos anos lançou três livros, criou o selo editorial Encrenca –Literatura de Invenção e virou sócio do café, livraria e editora Arte & Letra.
Linhares começou a escrever como qualquer principiante, falando daquilo que gostava. Seu primeiro projeto literário foi o “Detetive Linhares”. Já tinha material para três livros, quando chegou à conclusão de que não estava trazendo nada de novo. “Era uma novela detetivesca, com aquele clima noir que você encontra em outros escritores do gênero. Não era isso que eu queria”, explica.
A insegurança acabou vencendo dessa vez e Linhares acabou deixando o projeto de lado. Foi só em 2010, quando passou a participar do Núcleo de Dramaturgia do Serviço Social da Indústria (Sesi), que as coisas começaram a caminhar. Sob a orientação do dramaturgo Roberto Alvim, a proposta do curso era fazer com que os alunos encontrassem a sua “voz demoníaca”, ou melhor dizendo, a tão almejada pelos artistas “voz autoral”.
Um dos resultados desse processo foi o texto “Lazarus”, que viria a integrar o seu primeiro livro de contos Pancrácio (Encrenca, 2013), que compõe a Trilogia da Turbulência. Ao ler o texto no Núcleo, ouviu de Alvin “Isso, agora você entendeu”. Com o aval do mestre, continuou escrevendo, sempre seguindo a voz de seu demônio interior.
A música e a poesia ajudaram a encontrar uma fluidez em meio a dureza das frases. Ainda assim, a perfeição demorou a chegar.
“A escrita pra mim é um negócio que flui. Tento ser o menos racional possível e depois vou ver o que acontece”, conta Linhares um dia ao juntar seus textos, percebeu que em todos faltava uma coisa: vírgulas. Passado o primeiro susto, Linhares se deu conta que isso dava personalidade ao seu texto, além de velocidade a narrativa. “Eu tinha um vício da faculdade de explicar muito as coisas, que vinha pelas vírgulas. Só que na literatura isso é enfadonho. O leitor não é burro. Eu não preciso explicar tudo”.
Com a decisão tomada, as vírgulas se foram. Mas aí foi preciso um exercício de delicadeza para lapidar o texto, costurar as palavras umas nas outras para que ainda fizessem sentido. A música e a poesia ajudaram a encontrar uma fluidez em meio a dureza das frases. Ainda assim, a perfeição demorou a chegar.
“O Pancrácio ainda é muito duro. Já em O Esculpidor de Nuvens [segundo livro do autor lançado em 2015], como o narrador é uma criança, isso me deu uma certa leveza. Mas com O Cão Mentecapto [2016] a linguagem realmente existe, pra mim ele é perfeito” afirma Linhares.
Aos 39 anos, o curitibano oferece ao público uma originalidade singular, com uma escrita potente e sem censuras. Linhares já planeja um próximo livro, resultado dessa sua proposta estética desenvolvida nos três livros, porém sem ter nenhuma ligação com a narrativa dos mesmos. Sem pressa em terminar, o autor já avisa que podem demorar alguns anos até termos uma nova obra em mãos.