Andrew Solomon é um desses autores que escrevem sobre sua própria realidade em um exercício de exorcismo de seus demônios interiores. Obcecado pelos temas de seus livros, busca o conhecimento já produzido pelo homem sobre aquele assunto e tenta condensar em um livro que, não raro, ultrapassa facilmente as 500 páginas. Dentre todos, o mais pessoal e o mais diretamente assertivo é, sem dúvida, O Demônio do Meio-Dia, em que trata de uma doença que transformou completamente a sua vida: a depressão.
Partindo de sua própria experiência – Solomon, que mergulhou em uma depressão profunda que tem origens em episódios de infância e em alguns aspectos familiares, adquiriu comportamento suicida e tentou dar fim a sua vida algumas vezes –, o autor tenta elucidar alguns aspectos dessa doença misteriosa cujos pacientes sofrem principalmente pelo preconceito. Esse, aliás, foi um dos motivadores para a produção do livro, segundo o autor: retirar o tabu que há sobre a depressão e entende-la como uma doença. “Acredito que a dor precisa ser transformada, não esquecida; contrariada, não suprimida”, diz em sua introdução.
Dessa forma, entrevistou diversas pessoas e não escondeu suas identidades, e tampouco relativizou o que aconteceu a si próprio. Conta de suas experiência de risco, fazendo sexo com completos desconhecidos em locais públicos para tentar contrair aids e poder cometer suicídio por causa da doença, sabendo que seus familiares nunca se perdoariam caso ele tirasse a própria vida apenas por causa da depressão, e conta como o apoio de familiares e a assistência médica foi importante nessas situações. Em cada capítulo, trata de um aspecto diferente da doença, como tratamentos convencionais e alternativos – fazendo aqui uma defesa ampla de todos eles, inclusive de tratamentos controversos como o eletrochoque –, os sintomas mais comuns em cada caso, a distribuição da depressão em diferentes populações e a história da descoberta da doença na civilização. Todos eles sempre pontuados por histórias reais, quando não a sua própria.
Em cada capítulo, trata de um aspecto diferente da doença, como tratamentos convencionais e alternativos – fazendo aqui uma defesa ampla de todos eles, inclusive de tratamentos controversos como o eletrochoque.
Embora completo para leigos, O Demônio do Meio-Dia peca ao ser superficial em diversos capítulos, e ao tentar explicar de maneira simplista os processos químicos e os efeitos farmacológicos no sistema nervoso, passa a sensação de que a profundidade do livro acaba junto com a curiosidade do autor sobre aquele tema. É bem verdade que em suas mais 500 páginas o autor consegue filtrar e compilar informações que só seriam encontradas em diversos artigos e livros publicados separadamente, de maneira que a obra serve como uma introdução para cada tópico, além de possuir um fundo de relato jornalístico importante que garante legibilidade fácil para suas páginas.
A leitura de O Demônio do Meio-Dia não é cansativa em si, mas o assunto, tão vasto e tão pouco objetivo, acaba se tornando eventualmente. Ainda assim, é um livro importante que precisava ser escrito por inúmeras razões. Tirar a depressão da obscuridade e conduzir pacientes e familiares para um processo de elucidação e compreensão de uma doença incompreendida justamente por se esconder do resto do mundo.
O DEMÔNIO DO MEIO-DIA | Andrew Solomon
Editora: Companhia das Letras;
Tradução: Myriam Campello;
Tamanho: 584 págs.;
Lançamento: Abril, 2014.