Não é de hoje que o Rio Grande do Sul tem se firmado como um dos principais celeiros da literatura brasileira. Nomes como Érico Veríssimo (1905 – 1975), Dyonélio Machado (1895 – 1985) e Mario Quintana (1906 – 1994) nasceram e produziram nos pampas.
Dentre os contemporâneos, Michel Laub e Daniel Galera, por exemplo, mantêm a tradição – que já passou pelas mãos de Caio Fernando Abreu (1948 – 1996) e João Gilberto Noll (1946 – 2011). Cristiano Baldi tem seguido a mesma trilha em seu livro Correr com rinocerontes, uma espécie de romance de formação dos millennials.
Com uma narrativa ácida e ágil, Baldi faz de Igor, seu protagonista, o porta-voz de uma geração perdida. O livro é pontuado por tragédias, que se ligam à guisa de criar um fio condutor, uma costura sarcástica capaz de levar o leitor ao íntimo dos personagens. Sem subverter o quintal de casa, o escritor consegue faz da história um conto universal – sem exigir que se conheça de antemão Porto Alegre.
Como Galera fez em Barba Ensopada de Sangue – e não conseguiu repetir em Meia-noite e vinte –, Baldi constrói a figura perfeita do anti-herói: jovem, cheio de ideais, mas que afunda nas dúvidas e na pressão de viver uma vida ortodoxa e normativa.
Correr com rinocerontes é um romance sobre investigações e perseguições, ambas em um caráter muito pessoal e intrínseco em um homem revoltado consigo e com os outros.
Correr com rinocerontes é estritamente contemporâneo: as frases são pontuadas como uma conversa de bar, uma narrativa contada boca a boca nos corredores de uma faculdade de letras ou enquanto amigos tomam cerveja e fumam escondidos no quarto. A artimanha dá ritmo ao livro, cria uma atmosfera informal e prosaica. Como escreve Paulo Scott na orelha do livro, Baldi “passa ao largo do bom-mocismo”, reafirmando o não-compromisso com a linearidade de uma vida acadêmica.
Igor, responsável por um grave acidente anos antes, é um sujeito forte de espírito e que precisa lidar com os pequenos acidentes que se acumulam dia após dia. É preciso religar-se à família e às tradições, sentir-se vinculado novamente aos seus e isso, talvez, seja o processo mais complexo para o protagonista – que abandonou a capital gaúcha para viver e estudar em São Paulo. Longe de todos, pode-se ser mais a si próprio.
Ao mesmo tempo, imagens/fotos são espalhadas pelo livro, criando uma segunda leitura e reforçando aquilo que está escrito. Ainda que não há um só quê de policial, Correr com rinocerontes é um romance sobre investigações e perseguições, ambas em um caráter muito pessoal e intrínseco em um homem revoltado consigo e com os outros. Igor sabe que não há fuga: cedo ou tarde estará frente a frente com a tormenta. É impossível correr da tempestade.
CORRER COM RINOCERONTES | Cristiano Baldi
Editora: Não Editora;
Tamanho: 288 págs;
Lançamento: Junho, 2017.