Em 1968, Jorge Luis Borges proferiu uma série de conferências em Harvard, que posteriormente foram compiladas no livro Esse Ofício do Verso. Para Borges, forma e substância são indissociáveis na música. A música brotaria de emoções e nos conduziria a estas mesmas emoções. Seria esta a razão, segundo Borges, para o crítico e ensaísta literário Walter Pater ter afirmado que toda arte aspira à condição da música.
E sobre a poesia Borges fala: “Porém ainda assim tem um sentido – não para a razão, mas para a imaginação.” Podemos buscar inúmeras maneiras de definirmos o “fazer poesia”. Seja uma forma de utilizar palavras ditas “comuns” e extrair-lhes mágica, ressignificá-las perante a orquestração linguística, representando coisas mundanas ou verdades profundas, ou, ainda, não significando absolutamente nada à razão, mas dotadas de sentido estético.
No fim das contas, o que nos importa é se as palavras estão vivas ou mortas, se elas conversam com as emoções do autor, se lhe dizem respeito, se são pertencidas por ele, e por quem dele se furta, posto que a poesia é feita para o roubo, nunca pertencendo na imobilidade de seu autor.
Assim se esconde (ou se escancara) a poesia na obra de Troy Rossilho. De dedos ágeis e dedilhado suave, a voz grave penetra as mentes e corações nesta chuva em forma de cidade que é Curitiba. Parceiro constante do onipresente Luiz Felipe Leprevost, Troy flexiona versos e acordes, vagando entre a simetria e a assimetria propositadamente contraditória dessa solapada música popular brasileira.
De dedos ágeis e dedilhado suave, a voz grave penetra as mentes e corações nesta chuva em forma de cidade que é Curitiba.
Ao apresentar suas linhas poéticas, Troy Rossilho abusa da condição básica da arte, de nos resgatar frente às condições sufocadas da selva de pedra de nossa Curitiba. Homem de cinco discos, o último com Os Calvos, Rossilho galgou o petit-pavé subversivamente, gentilmente pedindo licença para entrar, mas arrebatando no caminho os corações solitários com suas interpretações intensas, artísticas, porém, humanas, demasiadamente humanas.
Seu novo mergulho, o projeto Uma por Mês, funciona como homeopatia, fazendo chover em parcelas as suas novas canções. A primeira, “Partitura em Silêncio”, uma doce parceria com Bia de Luna, mora desde janeiro num canto particular, em silêncio, como Troy quase sussurra na canção. Saí da audição crente que era uma partitura, um dos versos, uma poesia completa, quiçá uma antologia. É sempre assim, na contradição do ser e não ser.
Troy sobe com Os Calvos no Festival Ruído nas Ruínas, no sábado, às 14h. Afirmo: poeticamente imperdível.