O Paraná tem um apreço em “caipirar” o rock. Ainda que haja uma predominância pelo folk mais tradicionalista, temos bons exemplos de quem abraçou a caipirice com identidade própria, como Os Irmãos Carrilho, Charme Chulo e Tiregrito. Entretanto, o bom rock com DNA sulista ainda se esconde, chegando a dar a sensação de que o gênero imortalizado em grupos como Lynyrd Skynyrd e Molly Hatchet não fosse capaz de encontrar espaço nos ouvidos do paranaense. Por sorte, era apenas uma errônea ilusão, até porque a BraveHeart, banda curitibana formada em 1992 (ainda com o nome de Black Aposteme), já mostrava a fúria indomável do Southern Rock, ainda que abraçando algumas outras camadas de referências pelo caminho.
No trabalho da BraveHeart, que do início da banda só manteve Michael Bahr, vocalista e baixista do grupo, não é tanto a simplicidade do campo em constraste com riffs pesados que permeiam a essência do trio (completado por Marcos Camillo e Silvio Filho). O caipira da BraveHeart é mais complexo, seja na sua relação com o mundo e as inúmeras nuances e implicações da vida adulta, seja no que alimenta o “eu-lírico”. Ainda assim, algumas características marcantes do Southern Rock tradicional estão visivelmente impressas nos trabalhos da banda, como a boa construção musical e vocais rasgados, de forma que te envolvem quando as canções tocam.
O último trabalho do trio, Dedicated to My Heart, lançado no segundo semestre do ano passado, representa um novo momento do grupo, talvez mais próximo das origens do gênero, lá no sul dos Estados Unidos. Há mais espaço ao trovadorismo da música country, relatos do cotidiano acompanhados de voz e violão em um dedilhado clássico. Mas Dedicated to My Heart não se resume a isso. Em “Don’t Get Me Wrong”, por exemplo, a cozinha da BraveHeart aparece guiada por Silvio e acompanhada por uma linha de baixo mais presente e cadenciada, batendo o selo de a grande balada do disco.
O último trabalho do trio, Dedicated to My Heart, lançado no segundo semestre do ano passado, representa um novo momento do grupo, talvez mais próximo das origens do gênero, lá no sul dos Estados Unidos.
“Who’s to Blame”, canção que abre Dedicated to My Heart, é retrato das freeways, uma canção que começa de forma lenta, até que entre a pegada mais vibrante. A canção, uma digna música sobre descobrimento, sobre mergulho em autoconhecimento através da reflexão sobre os passos já dados, faz, tranquilamente, com que você reflita sobre o que já viveu. Não chega a ser uma balada, mas quase chega a agir como uma. Assim como a faixa seguinte, “Guilty”, a que vemos com maior força o trabalho vocal de Bahr. O exercício do cantor em criar uma paisagem sonora inserindo notas de forma precisa é o maior exemplo da potência de um grupo amplificada pelo trabalho preciso de ensaio, produção e estudo de teoria musical.
O disco marca, como o próprio grupo admite, uma mudança conceitual em sua carreira, sem, no entanto, descaracterizar a história que conduziu a BraveHeart até os dias atuais. Por sinal, discos como o seco e denso This House is My Head (2006) e o cru Hiding Place (2001), quando postos lado a lado com o último trabalho, servem claramente como uma ponte, peças necessárias na formatação da sonoridade de hoje da banda, além de marcar a evolução natural da BraveHeart. Afinal, há muito chão nessa freeway.