Diego Perin escolheu marcar seu retorno à cena musical curitibana com um olhar mais sério e crítico do que fazia na Banda Gentileza. Cabresto, seu primeiro EP, lançado no último dia 19, conta com quatro faixas que discorrem a visão do compositor sobre diferentes temas urgentes da contemporaneidade. Com uma veia forte para um discurso provocativo, o ex-baixista da Gentileza assume um risco calculado no álbum.
Mas afinal, o que podemos chamar de ser provocador na música contemporânea brasileira? Vivemos momentos conturbados de nossa história, o que leva a que muitos artistas optem por seguir a trilha de um discurso mais politizado, engajado. Se por um lado esta é uma opção necessária – todo artista precisa marcar posição ciente do peso de seu posicionamento e sua colocação na vida como um ator político -, por outro nos vemos saturados por discursos rasos, criados com o único propósito de ir ao encontro do que um grupo pensa – ao que convencionou-se chamar de “lacração”.
Esse cenário cria um difícil exercício de saber separar o joio do trigo, analisar cada discurso e cada proposta com um filtro capaz de identificar ideias e falas condizentes com as atitudes e comportamentos, campo tão (ou mais) importante que o das palavras – que valem pouco se não levarem à ação.
Não é tarefa fácil criar e expor sua visão sobre temas tão latentes e tão caros a certos grupos de pessoas. Perin cria um jogo metafórico, ora explícito, ora implícito, para tocar nestes temas que circundam nosso cotidiano. Seu grande mérito é escolher um eu-lírico razoavelmente delineado, que se não trafega exclusivamente sob uma única voz, ao menos não força associações limitadas sobre o que vivemos, tampouco se manifesta fazendo uso de senso comum.
Seu grande mérito é escolher um eu-lírico razoavelmente delineado, que se não trafega exclusivamente sob uma única voz, ao menos não força associações limitadas sobre o que vivemos, tampouco se manifesta fazendo uso de senso comum.
Mas se a arte reflete o mundo que habitamos, de que forma conseguimos com que o mundo reflita a arte que fazemos? Diego Perin se esforça em responder esta pergunta mergulhando nos sentimentos alheios, disposto a encontrar algo do outro em si (Nesse corpo moído pode conter traços de mim / “A Dor dos Outros”). Ao mesmo tempo, descortina as idiossincrasias que se aglutinam nas selvas de pedra modernas (Você e eu / somos o sumo da cidade / espremem nossa liberdade / querem nos fazer sangrar / “Tapeçaria de Asfalto”).
A seriedade dos argumentos trazidos à luz em Cabresto encontra um equilíbrio na transposição de ritmos, uma mescla harmoniosa entre rock, brega e mesmo afrobeat, mostrando que Perin compreende que o mesmo público em quem ele pretende encontrar eco com suas composições é tão plural quanto possível, concreto e humano, par e ímpar.
Cabresto tem o traço do artista conectado à realidade que precisamos, mesmo que sonoramente ofereça pouco de novo quando colocado em perspectiva aos lançamentos da geração de artistas à qual pertence. Por último e não menos importante, o registro carrega o DNA de Rodrigo Lemos, que além de produzir e mixar o disco, toca baixo, bateria guitarra e sintetizador.
Por sinal, o que não falta a Cabresto são nomes expressivos da cena local, como Vinicius Nisi (A Banda Mais Bonita da Cidade), Douglas Vicente (Charme Chulo), João Taborda (Trombone de Frutas) e o duo Estrela Leminski e Téo Ruiz. Diego Perin quis dizer (e cantar) a que veio e não o fez sozinho. Certo ele.