As estações do ano são bem mais que alterações no clima e a aproximação ou distanciamento da Terra e do Sol. Estações são estados de espírito. O inverno pode ser melancólico e/ou aconchegante, a primavera renovadora, o outono contemplativo e o verão, bem, o verão pode ser tranquilo ou caótico e empolgante. Eu prefiro a primeira opção. O verão que representa o começo de um novo ciclo, o descanso depois de um ano e aquele calor que esquenta o corpo e a alma. Assim, o verão tem também as suas canções. A trilha sonora de verões tranquilos deitado na rede ou caminhando na praia.
Guardo para essa época do ano os sons que me dão vontade de dirigir por horas com o vento na cara mas que, ao mesmo tempo, dão uma preguiça boa. É como a voz arrastada e a guitarra limpinha de Mac DeMarco em “No Other Heart”, do disco Another One (2015), um dos mais tocados no verão próprio deste que aqui escreve. DeMarco soa como se estivesse tocando e cantando sentado na varanda de casa usando chinelos de dedo e tomando uma cerveja barata enquanto vê o dia passar e olha dentro da cabeça o filme do ano que se foi. É a preguiça colocada da forma mais gostosa possível em acordes, fórmula que se repete nas oito faixas desse disquinho obrigatório na playlist de dezembro e janeiro. Como não relaxar e se deixar levar ao som de “Without Me”, versão em áudio da sensação de boiar descompromissadamente na água?
É dos melhores o soft rock /jangle pop/dream pop de Mac DeMarco, esse bizarro músico canadense que já fez uma canção de amor a uma marca de cigarros.
É dos melhores o soft rock /jangle pop/dream pop de Mac DeMarco, esse bizarro músico canadense que já fez uma canção de amor a uma marca de cigarros, colocou seu endereço em uma música e convidou os fãs para irem o visitar e tomar um café (e eles foram) e organizou um churrasco no meio da rua num dia de verão em Nova Iorque. O joie de vivre de Mac DeMarco e suas ideias aleatórias combinam com o verão despreocupado.
Menos preguiçoso mas tão bonito quanto, e provavelmente a melhor trilha sonora para cair na estrada sem pressa numa manhã ensolarada, é o som dos norte-americanos do Real Estate. Há dois anos sem lançar nada, Atlas (2014), último registro de estúdio da banda, ainda é uma presença frequente graças a um estilo que eles aperfeiçoaram numa mistura de surf rock, jangle pop e as melhores guitarras do indie rock nos últimos anos. As melodias aliadas ao vocal suave criam climas perfeitos, como em “Had to Hear”, uma das faixas principais de Atlas.
Tranquilo e feliz, o som do Real Estate é um pedido por um dia de folga com a música de trilha sonora. É leve, limpo e parece que traz consigo uma brisa refrescante de verão. É música feita para a estação como estado de espírito, canções para acompanhar a vida e fazerem sentido em algum contexto.