Boa parte da produção da música pop do ano passado para cá buscou referências em batidas mais sensuais, lentas, algo que bebe lá do R&B de décadas atrás mas se encontra com a música eletrônica atual. A guinada do último disco do Justin Bieber é um bom exemplo e marcou bem uma nova safra de trabalhos mainstream inspirados no trabalho que alguns produtores alternativos vinham fazendo há algum tempo. Desde o eletrônico de Jamie xx até um grupo que estava enquadrado em algo chamado de alt R&B. Nessa turma, um dos nomes mais legais dos últimos anos é o How to Dress Well, projeto do norte-americano Tom Krell.
O How to Dress Well tem um quê único desde o começo. Lá em 2010, lançou o primeiro disco, Love Remains, com uma coletânea muito mais lo-fi e experimental eletrônica do que qualquer outra coisa, mas que abriu caminho para Total Loss (2012), que chamou a atenção de toda a crítica musical. Era um grandioso disco que misturava música eletrônica ambient com R&B de pegada sexy e letras profundas e românticas. Explicava-se pela figura curiosa de Tom Krell, um cara formado em Filosofia que atualmente está fazendo doutorado com uma tese sobre niilismo e a filosofia alemã nos séculos 18 e 19. Além de toda sua habilidade em criar melodias e climas com a música, Krell conseguia escrever grandes letras com significados além do implícito, com verdadeiros contextos filosóficos sobre amor e perda.
Além de toda sua habilidade em criar melodias e climas com a música, Krell conseguia escrever grandes letras com verdadeiros contextos filosóficos sobre amor e perda.
Todos esses conceitos se uniram a uma produção mais caprichada e menos minimalista em What Is this Heart (2014), que firmou o How to Dress Well como um dos melhores nomes da cena e o deu moral para trabalhar com grandes gravadoras. Assim ele chega ao quarto disco de estúdio com o recém-lançado Care, uma sequência mais pop-dançante do trabalho feito por Tom Krell desde 2010.
Care traz 12 faixas que misturam baladas românticas, narrativas sensuais entre quatro paredes, batidas dançantes e belos falsetes. É um disco com menos momentos tristes e introspectivos que os anteriores, mas que esconde letras sobre nervosismo e desejos de ser amado atrás de batidas alegres, como na faixa “Anxious”, que lembra muito algo feito pelo Passion Pit, em que Krell canta sobre ansiedade e crises de pânico em cima de uma melodia quase dançante.
Produzido em parceria com Jack Antonoff (que, entre outros, esteve muito presente no último trabalho da Taylor Swift), Care traz um apelo pop extra à música do How to Dress Well e um pouco menos de reflexão, mas com a essência filosófica da Krell presente. O capricho na produção ganha mais destaque, com detalhes em cada segundo feitos para o ouvinte mergulhar. A primeira faixa, “Can’t You Tell” mostra logo de cara a pegada sensual que o disco tem, com uma canção sobre sexo na voz quase sussurrada do músico; uma fórmula que se repete em vários outros momentos e contrasta com a reta final do álbum, que tenta buscar um lado do How to Dress Well com foco no piano, pequenos sinos no fundo e espaço para a voz de uma forma quase acústica.
Total Loss (2012) é um dos trabalhos mais diferentes e bonitos que ouvi nos últimos anos, com uma emoção latente que o How to Dress Well foi perdendo com o tempo, embora ainda tenha um lirismo acima de quase qualquer outro ato pop atual. Não existe, talvez, na música eletrônica alguém tão preocupado com as mensagens e significados das canções quanto Tom Krell, então até em seus momentos mais dançantes há um mundo ao redor das batidas. Então Care traz ótimas canções quando se propõe a ser um disco de R&B sensual, mas perde um pouco da essência do projeto em meio à produção. No entanto, se Krell queria fazer um disco mais animado, com emoções menos dramáticas que os álbuns anteriores, teve sucesso.