Em clima de faroeste, as cantoras Simone e Simaria são bandidas procuradas no clipe de “Regime Fechado”, uma super produção que conta com as participações de Giovanna Ewbank, Nego do Borel, entre outros. Gravado em Goiânia e com direção de Rodrigo Van Der Put e Bruno Duarte, o vídeo não é inovador nem genial, porém, é suficientemente divertido e representa bem o crescimento do mercado dos videoclipes no Brasil, isso graças ao sertanejo universitário e ao funk.
O videoclipe mudou a linguagem audiovisual nos anos 80, especialmente com o surgimento da MTV, em 1981. No Brasil, essa linguagem era utilizada já nos vídeos musicais exibidos no Fantástico desde a década de 1970, espaço reservado apenas a grandes nomes, como Gal Costa, Ney Matogrosso e Belchior.
Com o fim da MTV Brasil como a conhecíamos, em 2010, os clipes já haviam encontrado seu novo espaço: o YouTube.
Nos anos 80, com o falatório em torno da MTV e o boom do rock nacional, começou-se a produção de vídeos de forma mais independente, para além do universo do Fantástico. O filme Tropclip, de 1985, por exemplo, apresenta um grupo de jovens que cria a sua própria produção de vídeos. Em meio ao filme, alguns clipes de artistas como Barão Vermelho e Roupa Nova são exibidos, uma tática comum na época e que pode ser vista em outros filmes, como Bete Balanço, por exemplo.
De qualquer modo, só começamos a pensar mesmo o videoclipe nacional quando a MTV Brasil surge, em 1990. Em seus anos iniciais, a emissora viu que não havia um mercado produtor de vídeos e, portanto, acabou financiando muitos dos clipes exibidos nos primeiros anos no canal.
Com o passar do tempo, tornou-se natural para muitos artistas produzir videoclipes para seus lançamentos, porém, esses artistas eram tão somente aqueles atrelados à linha editorial da MTV, isto é, rock, pop, alguns nichos da MPB e rap. Nos anos 90 e 2000, vimos grandes clipes de gente como O Rappa, Pato Fu, Pitty e Racionais MCs, porém, sempre restritos ao universo da emissora. Poucos artistas de outros gêneros investiam em videoclipes, pois não havia demanda para exibição desse material.
Com o fim da MTV Brasil como a conhecíamos, em 2010, os clipes já haviam encontrado seu novo espaço: o YouTube. Nesse espaço, não há linha editorial e foi isso que diferentes gêneros foram descobrindo aos poucos: um mercado audiovisual de nicho tão forte quanto uma emissora de TV.
O maior exemplo disso é o canal Kondzilla, que leva o nome artístico de Konrad, o diretor de alguns dos mais importantes clipes do funk nos últimos anos. Produzindo desde 2011, ele é um dos responsáveis pelo boom do funk de São Paulo, de nomes como MC Guimê e MC Livinho.
Com mais de 17 milhões de inscritos em seu canal, o Kondzilla criou uma marca forte, que já fez com que artistas como Karol Conká, Vespas Mandarinas e Racionais MCs também quisessem clipes com sua assinatura. Há uma marca bem delineada da estética do Kondzilla, que bebe muito do rap norte-americano: garotas bonitas, ostentação, um apelo sexual forte e cores fortes, que mesclam o tropical e o urbano.
De qualquer modo, essa marca estética não impede, por exemplo, que o Kondzilla dirija um clipe com ar de gângster neon para os Racionais em “Um preto zica”. O melhor exemplo da criatividade distinta do Kondzilla é o recente clipe de “Cara de Mau”, do MC Bin Laden, que mescla inspirações de M.I.B. – Homens de Preto com um universo de seres humanos sem face, tudo ainda mantendo seus padrões usuais.
Os cantores de sertanejo universitário também encontraram um espaço importante no YouTube: com vídeos de apresentações ao vivo que superam os milhões de visualizações, as duplas passaram a produzir videoclipes que reforçavam o life style vendido em suas músicas: mulheres bonitas, cerveja gelada e muita festa. O clipe de “Balada Louca”, do Munhoz e Mariano, é praticamente o Santo Graal de toda uma gama de clipes que surgiram em sequência.
Com a utilização desse universo à exaustão, hoje em dia os sertanejos buscam novas linguagens e isso é bastante positivo. O clipe de “Eu era”, de Marcos e Belutti, por exemplo, é um bem executado plano sequência, gravado todo em um estúdio com distintos cenários pelo qual a protagonista vai passando, representando uma malfadada noite.
Nesse cenário de um renascimento do videoclipe, o Chico Barney, colunista de entretenimento do UOL, afirmou que a Anitta era a responsável por esse ressurgimento do formato. Não tenho dados para confirmar isso, mas podemos dizer que ela é a musa desse renascimento, já que alguns dos clipes mais vistos atualmente no YouTube contam com a presença da funkeira, desde seu hit internacional com o Major Lazer e a Pabblo Vittar, até suas parcerias com Nego do Borel, Wesley Safadão e Simone e Simaria.
Anitta responsável pelo retorno do investimento em clipes no Brasil.
— Chico Barney (@chicobarney) August 7, 2017
Aliás, o clipe de “Loka”, da dupla de feminejo ao lado de Anitta, já tem mais de 400 milhões de visualizações no YouTube. “Regime Fechado”, em menos de 4 dias, já contava com mais de oito milhões de visualizações, a prova de que há uma demanda do público por esse tipo de conteúdo. O clipe, além disso, foi lançado com exclusividade no Vídeo Show, da Rede Globo, um espaço de menos prestígio que o Fantástico, mas que tem sido comumente utilizado para esse tipo de lançamento na emissora.
Enfim, nem só de clipes da Lady GaGa vive o universo pop e, cada vez mais, os gêneros nacionais estão entrando nesse cálculo. Há um sem-número de artistas que eu não citei aqui produzindo clipes e divulgando de diferentes formas, e isso é extremamente positivo.
Sempre falávamos no Brasil em videoclipes como algo feito de forma menor pelas gravadoras ou de forma bastante independente pelos artistas interessados nesse formato, mas nesse momento vemos realmente um mercado de produção se formando. Com uma quantidade cada vez maior de vídeos sendo lançados, é natural que vejamos produções distintas, novas idéias sendo aplicadas e, claro, inúmeros profissionais sendo pagos por essas produções.
Só esperamos que esse mercado renda bons frutos!