No dia 22 de junho, quinta-feira, a exposição Nirvana: Taking punk to the masses desembarcou no Rio de Janeiro, no Museu Histórico Nacional, onde fica até setembro, partindo depois para São Paulo – paulistanos poderão acompanhá-la até o final do ano. Antes de qualquer coisa, eu preciso dizer que já vi essa exposição.
Em 2013, quando tive a oportunidade de ir a Seattle, passei um dia inteiro no EMP, também conhecido como Museum of Pop Culture, um desses lugares em que pessoas como eu costumam experimentar um sentimento único de felicidade. Projetado para parecer uma guitarra destruída por Jimi Hendrix em um show, o EMP é a casa da exposição do Nirvana e de muitas outras, todas igualmente centradas na exploração do valor da memorabilia. Dito isso, preciso sublinhar, o lugar, a experiência, foi tudo maravilhoso e guardo até hoje com carinho as lembranças dessa viagem.
Assim, quando vi que a exposição viria ao Rio, decidi me precipitar logo no primeiro dia, impelida em parte pelo desejo de reviver os momentos que tive à beira do Puget Sound. A outra parte que me impeliu foi o papel crucial que o Nirvana teve na minha formação musical.
A primeira coisa que me chamou a atenção foi a quantidade de pessoas usando camisas xadrez (eu mesma também estava, achei que a oportunidade de mergulhar no túnel do tempo dos anos 90 era valiosa), assim como a idade média do público parecia oscilar entre os 40 e os 20 anos de idade.
Ao longo de um dos pavimentos térreos do museu, a exposição Taking punk to the masses tenta construir uma linearidade quase impossível na narrativa errática da banda e da cena grunge como um todo. A primeira parte consiste em alguns instrumentos que foram usados em shows e grandes fotos ampliadas cobrindo as paredes, com frases de efeitos dos integrantes e de outros personagens importantes, como, por exemplo, executivos da Sub Pop Records, a lendária gravadora de Seattle, que foi a primeira a lançar o Nirvana, o Soundgarden e muitas outras bandas do mesmo cenário.
Taking punk to the masses tenta construir uma linearidade quase impossível na narrativa errática da banda e da cena grunge como um todo.
A segunda parte da exposição é de fato seu ponto alto. Os diversos vídeos, todos oriundos do arquivo digital do EMP, espalhados em pequenos terminais interativos ao longo da exposição, são o que de fato consegue dar alguma coesão – e também uma pálida ideia – do que teria sido a Seattle do fim dos anos 80 e início dos anos 90.
Na ressaca da era Reagan, o rock alternativo e underground surgia como uma maneira de se colocar contra o corporativismo do mainstream. A ideologia punk, ressignificada (e isso é algo que o próprio Krist Novoselic chega a cogitar) e somada ao isolamento geográfico do Pacific Northwest, parece ter contribuído também para o que se tornaria o produto final mais bem-sucedido dali, o próprio Nirvana.
Em outra dessas entrevistas, o próprio Novoselic afirma que o Nirvana foi um erro, que eles falharam. Claro, a banda foi engolida pelo próprio mainstream que desejava combater, atingiu a fama mundial, mas na opinião do baixista, nenhum deles tinha estrutura emocional para lidar com a fama. Esse talvez seja um dos depoimentos mais contundentes do inventário digital do EMP.
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Duas grandes vitrines ocupam a parte principal da exposição, contendo fotos da banda, roupas que os integrantes usaram em sessões de fotos e shows e pedaços de guitarras que escaparam à fúria de Kurt Cobain. Uma das coisas que mais gostei de ver foi o setlist do show do Rio, que não me lembro de fazer parte da exposição permanente de Seattle. Ao mesmo tempo em que cada um daqueles objetos acaba sendo alçado à condição de relíquia, não apenas devido à trajetória meteórica da banda e o subsequente suicídio de Cobain, é inevitável pensar o quanto o agrupamento aleatório de todas essas coisas vai na direção completamente oposta do que seria o grunge.
Guitarras quebradas, álbuns que fazem parte da coleção pessoal dos ex-membros da banda, tudo se encontra revestido pelo verniz do consumo que beira a obsessão memorialística. Ao mesmo tempo em que é prazeroso observar polaroides antigas, guardanapos rabiscados e registros de apresentações que foram completamente insignificantes para o todo da carreira da banda, tudo que está agrupado ali constrói uma narrativa às avessas do que significa – ou significou – ser famoso no século XX. Parte de um momento geográfico e temporal único, o Nirvana não apenas transformou as camisas de flanela xadrez dos lenhadores de Washington no símbolo de uma geração, como também acabou ele próprio sendo devorado pelo mainstream.
Em resumo, Taking punk to the masses acaba sendo uma experiência interessante, na medida em que, por mais que seja impossível dar conta do que foi a explosão do grunge em si e o fenômeno Nirvana, consegue saciar a saudade dos antigos fãs ao mesmo tempo em que apresenta aos que não tiveram a oportunidade de testemunhar à época como funcionavam as coisas.
Faça um passeio em 360 graus pela exposição ‘Nirvana: Taking punk to the masses’, que está em cartaz no Museu Histórico Nacional, no Rio
Posted by O Globo on Thursday, June 22, 2017
Correndo o risco de, à essa altura, soar como alguma obcecada não apenas pela banda, mas pela nostalgia evocada pela exposição como um todo, quero dizer que Taking punk to the masses agrada muito aos fãs e é um verdadeiro túnel do tempo de volta a 1991. O que me impede, porém, de recomendar a toda e qualquer pessoa que simpatize com a banda a ida ao Museu Histórico Nacional é o preço elevado do ingresso (R$ 25 a inteira) e o fato de que nem todas as referências ficam claras para quem não bebeu na fonte do grunge. Bem, aos nostálgicos e saudosos, apenas um recado: aproveitem sem moderação.
SERVIÇO | ‘Nirvana: Taking punk to the masses’
Onde: Museu Histórico Nacional: Praça Marechal Âncora, s/n
Quando: de 22/06 a 22/08; terças a sextas, das 10h às 17h30; sábados, domingos e feriados, das 13h às 17h;
Quanto: de terça a quinta, R$ 25 (inteira) e R$ 12,50 (meia-entrada); de sexta a domingo, R$ 35 (inteira) e R$ 17,50 (meia-entrada);
Classificação: 16 anos;
Mais informações: Site oficial do Museu Histórico Nacional.