Depois de sua postura cretina e absurda no Dimebash, em janeiro, Phil Anselmo deveria ter sido presenteado com ingressos de primeira fileira para os shows que aconteceram no Sesc Belenzinho, em São Paulo, e o Curitiba Rock Carnival.
Tomada por uma simplicidade alucinante e sons rápidos, a banda Death se apresentou por aqui após mais 40 anos desconhecida. E a sua história, assim como sua música, é bastante interessante.
Sempre digo para amigos meus que a relação da música com a internet é uma via de mão dupla. Enquanto a rede facilita muito nosso acesso a bandas legendárias ou novos projetos, raramente ela se torna a grande protagonista de histórias curiosas. E quem vive de música sabe que uma boa história é um background tão importante quanto a análise instrumental e saber o equipamento que cada artista usa. E no caso do Death, sua história é tão — ou mais incrível até — que seu trabalho. Mas é muito difícil dizer qual dos dois é importante.
Formada por três irmãos negros — Bobby, Dannis e David Hackney — na Detroit dos anos 70, e no meio de um importante movimento sobre igualdade racial, o Death gravou um único EP de 7 polegadas, que foi rejeitado por inúmeros selos. Entre os motivos estavam o nome da banda, pesado demais, e o fato de que as gravadoras achavam que aquele tipo de rock n’ roll não era o tipo de som que eles deveriam estar fazendo.

A única oportunidade do Death foi um contrato com a Arista Records, que ofereceu US$ 20 mil desde que eles mudassem de nome. A banda rejeitou, prensou 500 cópias por conta própria e teve seu material engavetado e esquecido até então, quando foi achado por um rapaz em um sebo e que acabou levando o álbum para casa.
No caso do Death, sua história é tão — ou mais incrível até — que seu trabalho. Mas é muito difícil dizer qual dos dois é importante.
O resultado: um som contagiante e incrível, com muita referência a Stooges e MC5 e que era muito, mas muito punk rock, só que datado de 1975, dois anos antes da explosão do movimento. Hoje, o Death cativa uma geração nova com seu estilo e seu som, 40 anos após portas fechadas e com um trabalho remasterizado, além de um documentário dedicado a eles, o A Band Called Death.

Em relação ao seu trabalho, Death é uma compilação do melhor das bandas daquela época, com um toque extra de criatividade. A faixa de abertura do …For the Whole World to See, “Keep On Kocking”, tem uma base muitas vezes encontrada no trabalho dos Stooges e que parece uma base para o que o Bad Brains e o Black Flag fariam muito bem nos anos 80. Na sequência, “Rock-N-Roll Victim” parece uma fusão incrível de Misfits com MC5, com instrumentais rápidos, vocais meio tenebrosos, mas uma velocidade furiosa, conduzida pela guitarra de David — que faleceu em 2000.
O álbum continua por faixas cada vez mais rebeldes, como “Where Do We Go From Here”, que se torna o destaque do álbum, em uma fórmula que se não encanta pela simplicidade das músicas rápidas, faz isso pelo contexto época-momento-revolução de fundo, que faz do EP uma das coisas mais inovadoras do cenário na época, completamente subestimado e injustiçado.

De longe o …For the Whole World to See é uma das melhores novidades do momento. O trabalho nos leva de volta aos anos 70, em uma das escolas percursoras de um dos mais importantes movimentos do rock e soa como novidade até para os mais antigos. Além disso, sua história de fundo mostra o talento de três jovens que não só inovaram na sua música, como também inovaram na forma de contar uma história toda por trás de um álbum. E, por incrível que pareça, foi com o nome de Morte que uma banda fez o protopunk ficar vivo de novo.