Toda boa banda jovem de rock começa com urgência. A velocidade nas guitarras, as letras simples, a ansiedade à mostra direto da garagem de casa. Há quem opte por seguir assim, mas conseguimos dividir em um outro grupo os que vão em frente e crescem depois disso, não necessariamente perdendo a efervescência do rock, mas aprendendo novas maneiras de se expressar através dos instrumentos e criar uma música, digamos, mais ampla. Uma das ótimas bandas do gênero no Brasil atualmente seguiu exatamente esse caminho: os Selvagens à Procura de Lei.
O quarteto de Fortaleza chegou em 2011 com o bom Aprendendo a Mentir, um disco de estreia no melhor estilo “novo rock pós-Strokes”. Era indie rock rápido, mas com sinais claros de um regionalismo latente que deixava claro que eles não queriam imitar as tantas bandas estrangeiras do estilo nos anos 2000. Havia um toque político, como em faixas como “Mucambo Cafundó” (uma das mais queridas pelos fãs ate hoje) que ficou mais claro quando a banda lançou o homônimo Selvagens à Procura de Lei (2013), um grande disco com pegada oitentista e flertes com MPB. Dali pra frente a banda continuou trazendo mais referências para o seu som, o resultado veio no começo de março com Praieiro, o terceiro e mais diferente disco de estúdio dos Selvagens.
Praieiro segue a linha que mistura rock e MPB, mas coloca na mistura reggae, surf music e um clima bem mais tranquilo e menos urgente que o dos trabalhos anteriores. Como o próprio nome diz, é um trabalho voltado para a praia, enquanto os outros chamavam para um clima urbano. A faixa que dá nome ao disco resume o clima em três minutos instrumentais com sons de ondas batendo ao fundo. Não é, no entanto, um disco “de boa” dos Selvagens, já que as guitarras rápidas seguem presentes – e “Lua Branca” mostra isso logo na sequência de “Praieiro” -, mas há um toque mais tranquilo que pede mais calma até na hora de tratar dos assuntos polêmicos. Se nos trabalhos anteriores faixas como “Brasileiro” eram diretas, aqui “Guetos Urbanos” traz um singelo pedido de “vamos relaxar, o mundo inteiro vem pedindo calma”. Em tempos de ódio político talvez um pedido de calma seja realmente o ato mais sóbrio.
A banda continuou trazendo mais referências para o seu som, o resultado veio no começo de março com Praieiro, o terceiro e mais diferente disco de estúdio dos Selvagens.
A evolução do quarteto fica claríssima no primeiro single do álbum. “Tarde Livre” impressiona logo nos dez segundos iniciais com seu riff principal. É bonito e incrivelmente relaxante ao levar para a estrofe cantada em uníssono pelos integrantes. O uso das vozes diferentes é, aliás, um dos pontos interessantes dos Selvagens à Procura de Lei. Os quatro integrantes cantam. Rafael Martins e Gabriel Aragão dividem as guitarras e os vocais principais na maioria das canções, enquanto Caio Evangelista faz a segunda voz em alguns momentos e o baterista Nicholas Magalhães traz sua voz grave para completar, na mistura que deu muito certo no disco anterior na ótima “Despedida”. Aqui o baterista ganha duas músicas para brilhar: as belas “O Que Será o Amanhã” e “Projeto de Vida”. Tudo isso traz uma sensação de união para a banda que fica clara ao ouvir o disco e, especialmente, nos shows.
Se algumas das faixas mais puxadas para o reggae podem parecer estranhas ao ouvinte na primeira vez, elas ficam melhores ao ouvir Praieiro na íntegra e entender ele como uma obra. Dentro do show da banda elas se misturam ao setlist de rock sem destoar. Em turnê pelo Brasil para divulgar o disco, tive a chance de os ver no feriado da Páscoa e digo que vale a pena ficar de olho na agenda dos Selvagens para assistir a uma grande apresentação ao vivo. Há toques de Legião Urbana e Tim Maia que dão uma boa ideia do que influencia o grupo. É bom rock brasileiro e com referências nacionais, algo nem tão fácil de encontrar.