Peppermint e Cazwell são amigos de longa data e aproveitaram o delicado momento político norte-americano para lançar o EP Blend, com três faixas pop e de celebração LGBT, que buscam unir as referências de house e hip-hop de ambos.
Os dois artistas trabalham juntos desde o início dos anos 2000, tanto que Peppermint diz que os dois foram “praticamente casados” durante muitos anos, já que trabalharam de diferentes formas nesses quase vinte anos de parceria. Ambos são figuras importantes da cena LGBT norte-americana, especialmente em Nova York.
Peppermint é drag queen e atriz, e ficou conhecida mundialmente quando chegou ao Top 3 da nona temporada de RuPaul’s Drag Race, sendo a primeira mulher abertamente trans a entrar na competição (antes dela, algumas queens já haviam mencionado sua transexualidade no decorrer da série ou começaram suas transições após o show). No último ano, ela fez turnê ao lado das queens do reality, fez sua estreia na Broadway e ainda lançou um disco autoral, Black Pepper.

Cazwell é uma figura nem sempre levada muito a sério dentro da comunidade gay, porém é figura importante nos anos 2000: rapper branco e gay, ele lançou seu primeiro disco em 2006 e, de lá pra cá, usou e abusou de seu corpo malhado em clipes e canções divertidas, bem como bastante explícitas, que buscam se comunicar com a comunidade gay e fogem de qualquer higienização para o público hétero. Para quem desconhece sua figura, recomendo começar, de leve, por sua parceria com a ótima Peaches.
Para divulgar o novo EP, a dupla lançou o clipe de “Blend”, a faixa título do trabalho. Cazwell classifica a canção como um hino para a comunidade trans, que visa ressaltar de forma positiva o que é ser uma pessoa trans na atualidade. O rapper explicou, em entrevista a Billboard, que “quando você é uma mulher, especialmente uma mulher trans, você está sobre uma grande pressão para se adequar à sociedade e assim ninguém te deixar de lado por ser trans. Eu queria escrever uma canção que provasse a importância de não se adequar à sociedade e ser feliz do jeito que se é”.
O clipe começa com diferentes falas que tentam diminuir ou deslegtimar as vidas trans, desde decretos estapafúrdios de Trump até os impropérios ditos pela mídia de direita americana. Na sequência, em uma igreja, Peppermint e Cazwell começam a sua “conversão” para um mundo em que as pessoas trans sintam-se mais acolhidas e felizes como são. Confira o vídeo abaixo:
Esse encontro surge em um momento simbólico, que mostra a importância da união das diferentes letras da sigla LGBT.
As duas outras faixas do EP, “I’m Turning It” e “Harlem Cleopatra”, funcionam bem ao misturar o universo do hip-hop de Cazwell com a voz forte e intensa de Peppermint, tão usual no house. As três faixas têm força pop suficiente para se dançar em casa ou nas baladas, além disso, pode servir para boas perfomances de drag queens, com muito bate-cabelo.
Além disso, o lançamento de Blend é pontual, já que saiu alguns dias depois que a própria RuPaul, drag queen e criadora do reality show que leva seu nome, deu declarações polêmicas ao jornal The Guardian sobre a comunidade trans. RuPaul falou que mulheres trans não poderiam participar do reality show nem poderiam fazer drag, pois sua transição e suas mudanças corporais mudariam o conceito do que seria “drag queen” (na entrevista, ele fala que se Peppermint já tivesse suas próteses mamárias ela não poderia entrar na série, por exemplo).
O público do programa respondeu de forma contrária as conceitos de RuPaul, relembrando que algumas figuras fundamentais da história da arte drag são da comunidade trans. O apresentador acabou pedindo desculpas publicamente e disse que está em “constante aprendizado” e que não quis ferir em momento algum a comunidade trans, que ele chamou de “heróis da sigla”.
No final das contas, o encontro de Cazwell e Peppermint surge em um momento simbólico, que mostra a importância da união das diferentes letras da sigla LGBT para que tenhamos força perante os avanços de um pensamento retrógrado no mundo. Mais que isso, esse lançamento é a prova de que o bate-cabelo é também um ato político e que precisamos constantemente defender a nossa legitimidade em simplesmente existir e ser o que somos!