Nos anos de 1960, os rapazes vestiam-se com ternos e as moças com tailleurs. Na década de 1970 era vez das calças bocas de sino, das camisas com franjas e batas floreadas. Mesmo que nos 70’s, quem gostasse de um rock mais pesado já reverenciava seus ídolos mostrando alguma “serigrafia”, ouso concluir que o hábito de usar camiseta com nome de banda ganhou força e se tornou um hábito cultural na década de 1980.
Ao contrário do que acontecia com os vinis, que muitas vezes davam uma trabalheira pra se conseguir, quando não eram lançados no Brasil, camiseta era um lance mais fácil. Havia lojas que anunciavam em revistas de música. Vendiam e entregavam bonitinho pelo correio. O difícil era controlar a ansiedade, e o dinheiro, pra não comprar todas de uma vez. Dava medo, e às vezes acontecia, de deixar pra pedir no mês seguinte e ela não estar mais disponível.
Vestir camiseta de um artista era uma forma de mostrar não só seu gosto musical, mas sua atitude, sua identidade, sua intenção. Já puxei conversa por causa de camiseta. Já arranjei encrenca por causa de camiseta. Lembro-me de uma história com amigas dentro do ônibus. Uma delas, a Elena, vestia uma do Jesus and the Mary Chain. Uma senhorinha sentou-se ao lado dela e puxou conversa – “Bonita sua camiseta, filha. De qual igreja você é?”
Vestir camiseta de um artista era uma forma de mostrar não só seu gosto musical, mas sua atitude, sua identidade, sua intenção.
O bom da camiseta é que ela te eterniza e não te coloca no ridículo. Podem te julgar por, aos 40 e tanto, usar minissaia, coturno, cabelo roxo, mas de camiseta você é, no máximo, uma jovem senhora que um dia curtiu rock. Comprovei a força do traje tempos atrás quando fui a uma festa “revival”.
Criou-se um evento no Facebook para chamar as pessoas. Um dos posts mais animados era “Vocês vão de camiseta de qual banda?”. Era um encontro com pessoas que eu não via há 10, 20 anos e a impressão que deu é que a camiseta serviria como um guia pra reconhecer o antigo colega.
E assim foi. Muita gente de camiseta! E da mesma banda que usavam nos 80’s. E veio um filme na cabeça. Eu lembrei que, cada um ali, realmente tinha uma preferência no passado. E fazia questão de compartilhar, de sinalizar que ainda era importante. Usar uma camiseta de rock, é mais do que um simples ato estético. É demonstrar atitude, comportamento, uma forma de aproximação, de diálogo. Depois que fui embora fiquei pensando: “será que ela foi comprada às pressas ou já estava no armário sendo usada…”
Entretanto, eternizar nem sempre é bom quando falo em variedade. Quando vou à Galeria do Rock, em São Paulo, aquela imensidão de camisetas chega a ser frustrante. Nunca há uma novidade em termos de estampa. Sempre a mesma capa de disco. Acho que é querer demais da minha parte.
E tem o lado oposto – banalizar demais. Há grandes lojas de departamento lançando camisetas de rock, “homenageando” algumas décadas. Dia destes elas estavam bem na entrada de uma loja. Entrei pra ver qual era. Saí, veja só, com uma camiseta do Bowie. Do “Ziggy”, claro. E o que aconteceu com Unknown Pleasures, do Joy Division? Ano passado a estampa estava em camisetas vestidas por globais, meninas e meninos de pouquíssima idade, customizadas feito modelos de carnaval. Tive vontade de perguntar se a pessoa sabia o que estava usando. Melhor deixar.
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