Um caldeirão de estilos musicais e visuais. Metaleiros, mods, punks, góticos, comportados, excêntricos. Todos juntos no mesmo palco. Esta era a essência do legendário Top of the Pops (também conhecido como TOTP). A primeira edição, apresentada por Jimmy Savile e Allan Freeman, foi ao ar no dia 1º de janeiro de 1964. No line up, Rolling Stones e The Beatles (a BBC lamenta informar que perdeu a gravação desse programa).
Se olhando à primeira vista dá-se a impressão de que se trata de algo com gosto duvidoso, estão certos. O TOTP tinha, sim, um ar kitsch, muitas vezes era uncool e mostrava glamour em excesso. No entanto era visto por milhões de britânicos, que se sentavam em frente à televisão, todas as quintas-feiras à noite, pontualmente às 18h35 (depois mudou para 19h35. Em outra épocas às sextas, e nos últimos tempos aos sábados) para ver seus ídolos.
Quem não passasse pelo palco do TOTP, boa coisa não era. Só aparecia por lá quem estivesse no “Top 30” da parada britânica. O programa sempre acabaria com o registro número um daquela semana. Pense no orgulho de um pai, de uma mãe vendo seu filho, que até então os vizinhos só achavam que era um vagabundo, sem emprego, aparecer no TOTP.
O TOTP era um símbolo da Inglaterra. E quando os ingleses elegem algo pra chamar de seu, a Terra pode mudar de movimento e eles estarão lá, firmes amando aquilo. Kevin Rowland, do Dexys Midnight Runners, diria em uma entrevista: “é meu país e me sinto bem fazendo parte de algo que nos pertence. E também havia uma sensação de glamour que era boa.”
Quem não passasse pelo palco do TOTP, boa coisa não era. Só aparecia por lá quem estivesse no “Top 30” da parada britânica. O programa sempre acabaria com o registro número um daquela semana. Pense no orgulho de um pai, de uma mãe vendo seu filho, que até então os vizinhos só achavam que era um vagabundo, sem emprego, aparecer no TOTP.
Um fato relevante pesa sobre os artistas que aceitavam, na boa, estar no TOTP – foi lá que muitos deles viram pela primeira vez os artistas que iriam influenciar seu trabalho. Em 1972, quando David Bowie cantou “Starman”, uma boa turma do sofá de casa correu para os palcos.
Então, se não havia como fugir, o lance era se divertir. Muitos aproveitavam para fazer da apresentação uma performance e tanto. Alguns simularam striptease, como fez o Morrissey, em 1984, quando cantou “Willian it was really nothing”, com o The Smiths.
Os meninos do Madness eram campeões na zoeira. Em 1980, durante a apresentação de “My Girl”, Lee Thompson, saxofonista da banda, despencou do palco tomando muito cuidado para não quebrar seu sax de plástico!
Tocar bêbado também podia. Um trabalho nada difícil para Ian McCulloch do Echo and the Bunnymen que, em 1981, estava aos trancos e barrancos cantando “Back of Love”.
Também havia momentos de desagrado público. Em um deles, Malcolm Holmes, baterista do OMD, aparece com cara de poucos amigos, sendo obrigado a “tocar” “Messages” em uma bateria acústica. A produção não deixou que ele usasse seu kit de bateria eletrônica.
E, claro, havia os rebeldes que eram contra o playback e faziam questão de ficar longe do microfone – Adam & The Ants, Siouxsie and the Banshees (um esplendor nessa apresentação) e tantos outros. Quando o New Order estava com “Blue Monday” em alta na parada britânica, a produção do TOTP os convidou para tocar no programa. A banda e o empresário Rob Gretton deixaram claro que só iriam caso pudessem fazer a performance ao vivo. A BBC não aceitou a proposta.
Mas a música estava fazendo tanto sucesso que a emissora teve que ceder. No final de março de 1983, o New Order tocou, ao vivo, “Blue Monday” para milhões de britânicos. Bernard Summer, em sua biografia “Chapter and Verse” (sem publicação no Brasil), diz que não foi muito a favor. E que, ao invés de ser uma boa jogada, acabou derrubando a banda para baixo nas paradas seguintes. Em tempo, o New Order não foi a primeira banda a tocar ao vivo no programa. Na década de 1970 alguns artistas, como Elton John (em “Song for guy”), já haviam feito o mesmo.
E às vezes ocorria um “lost in miming”. No especial de Natal de 1984, teve homenagem à turma do Band Aid, liderada por Bob Geldof. Todos dublando bonitinho “Do they Know it’s Christmas”. Pena que, às vezes, voz não ornava com o rosto. Paul Weller (The Jam) virou o Bono Vox (que não estava presente, pois devia estar lotando algum estádio mundo afora). Veja abaixo.
Situação bizarra aconteceu com o All About Eve. Até hoje não se sabe se Julianne Regan and Tim Bricheno não estavam ouvindo “Marthas’s Harbour” para começar a dublar, ou se foi um protesto pela restrição a apresentações ao vivo.
Em 2006, o TOTP chegava ao fim. Depois de entrar no oxigênio no começo dos anos 2000, não havia mais como mantê-lo. No dia 30 de julho de 2006, foi ao ar a última edição do programa.
É possível ver grande parte das apresentações pela internet. Eu mesma só fui ter acesso a elas na era do Youtube. E digo, não prestou. Ficava lá, por horas. Uma apresentação levava à outra, que levava a uma melhor e assim o dia clareava.
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