Na tarde da última quarta-feira, a nova composição da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados foi formada. Composta por 20 deputados titulares e igual número de suplentes, renovada a cada ano, é papel da comissão, entre outras coisas, debater e votar temas relacionados ao desenvolvimento cultural, direito de imprensa e produção intelectual e sua proteção.
Na mesma sessão em que os nomes que compõem a comissão foram apresentados, foi eleito o deputado federal Marcelo Queiroz (PP-RJ) para a presidência. Sua chegada ao posto foi costurada através de acordo entre as lideranças partidárias e dos blocos parlamentares.
Desde sua criação, em fevereiro de 2013, é a composição com perfil mais conservador de sua história. Entres os membros titulares estão nomes controversos, como o ex-Secretário Especial de Cultura do governo Bolsonaro, Mário Frias (PL-SP), e o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos-RJ). Outros nomes da extrema-direita ficaram como suplentes, entre eles a deputada Bia Kicis (PL) e os deputados Pastor Eurico (PL) e Marco Feliciano (PL).
Completam os títulares da Comissão de Cultura: Abilio Brunini (PL), Airton Faleiro (PT), Alfredinho (PT), Alice Portugal (PCdoB), Benedita da Silva (PT), Defensor Stélio Dener (Republicanos), Denise Pessôa (PT), Eli Borges (PL), Felipe Becari (União), Felipe Francischini (União), Jandira Feghali (PCdoB), Lídice da Mata (PSB), Roseana Sarney (MDB) e Tiririca (PL).
Mario Frias, que em sua gestão à frente da pasta de Cultura no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro ficou marcado pelos ataques à classe artística, defendeu seu trabalho no setor, o governo anterior e afirmou que será fiscalizador da aplicação do dinheiro público.
Desde que assumiu o mandato, Frias já apresentou 5 projetos de lei, entre eles o PL 719/2023, que visa proibir a execução de músicas cujas letras “façam apologia ao crime, ao uso de drogas e/ou que expressem conteúdos sexuais” em instituições de ensino de todo território nacional. Como apontado pela jornalista Thais Seganfredo do Nonada, o projeto apresentado por Frias pode criar um perigoso cenário, pois não estabelece quais serão os critérios de classificação das músicas, fato que poderia servir como censura.
Sessão inaugural é mau indicativo para a comissão
Aberta a sessão inaugural da atividades, após a fala do presidente da comissão, Marcelo Queiroz, em que defendeu a necessidade de diálogo, respeito e superação das discordâncias ideológicas para aproveitar um momento em que a Cultura tem seu maior orçamento, ficou evidente o desafio que virá adiante.
Um dos primeiros a discursar, o deputado Abilio Brunini (PL-MT) usou seu tempo para reproduzir fake news. “Nosso papel principal é o de fiscalizar. R$ 10 bilhões é muito bom, mas precisamos averiguar onde esse recurso está sendo aplicado. Porque se for como com a Ludmilla e a Claudia Raia, não vai ‘dar coisa’ para muita gente”, se referindo à mentira contada em post pelo também deputado e ex-secretário especial da Cultura, Mario Frias, que afirmou que Ludmilla haveria recebido R$ 5 milhões de reais da Lei Rouanet para produzir um programa.
A extrema-direita, através dos representantes da Bancada da Bíblia, promete jogo duro na Cultura.
Quem também usou o microfone para discursar foi o deputado Marco Feliciano. Sem apresentar provas, falou que uma criança em sua cidade foi vítima de perseguição por ser branca e “fazer um rastafári”, se referindo ao penteado dreadlock. O parlamentar sinalizou que pretende trazer o debate sobre apropriação cultural para a comissão, porque a esquerda estaria “dizendo o que é ou não cultura”.
A fala de Feliciano ecoava outra fake news propagada na sessão pelo deputado Brunini, que disse que o governo federal teria um “monopólio para dizer que cultura é só música funk”, insinuando que o governo atual destinaria recursos apenas “a um tipo de cultura que é destrutiva à moral”.
Em tom de deboche, Marco Feliciano ainda deixou claro que não sabia quem era a titular do Ministério da Cultura, e que não sabia como se referir a ela. “Eu sei que é uma mulher, mas eu não sei se posso chamá-la de mulher ou não”, disse, sendo repreendido pela deputada Lídice da Mata. “Eu não a conheço, não tenho obrigação de conhecer a todos”, finalizou.
De maneira geral, ficou evidente a defesa, por diferentes parlamentares, de maior destinação de verbas e recursos federais para “cultura gospel”, usada como contraponto ao que chamaram de “discurso vigente” e de “projeto de degradação da família”. A extrema-direita, através dos representantes da Bancada da Bíblia, promete jogo duro na Cultura.
Crivella: da censura à Comissão de Cultura
Certamente o nome que mais chamou a atenção é o do deputado Marcelo Crivella (Republicanos). Ele não chegou a votar na eleição para presidente da Comissão de Cultura, e sua presença foi breve. Fez uso do microfone apenas para elogiar Marcelo Queiroz, uma espécie de pupilo do bispo, de quem foi secretário na prefeitura do Rio de Janeiro.
De volta à Câmara Federal após um mandato na prefeitura do Rio de Janeiro, o parlamentar tem na trajetória a censura do HQ Os Vingadores – A Cruzada das Crianças, durante a Bienal do Livro de 2019. Publicada originalmente pela Marvel, a história trazia um beijo entre dois personagens homens.
Antes de virar nome controverso na política, o bispo da Universal foi uma espécie de estrela pop da igreja, gravando discos como O Mensageiro da Solidariedade, foi certificado como platina duplo pela venda de mais de 160 mil cópias.
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