Eu sempre pensei que, talvez, esse pudesse ser um espaço também para se resgatar a história do teatro paranaense – tão vasta em afeto e, de certo modo, tão alheia a grande História do Teatro Brasileiro (assim, com letras maiúsculas) – não porque inexpressiva, mas porque a legitimidade, às vezes, parece se afastar do próprio teatro e depender de situações e agentes distanciados, por assim dizer. Em quase dez meses de coluna, essa é primeira vez que o meu desejo de abordar a temática mais de perto se efetiva. O fato disso surgir em uma semana em que foram poucas as atrações teatrais, bem como a recente notícia de que será, em 2016, reativado o Teatro de Comédia do Paraná, não parece totalmente à toa e se configura, então, como oportunidade e motivo.
Quando se fala em registro é sempre importante pensar os ímpetos da atividade e também as circunstâncias em que ele é feito. É possível identificar duas principais áreas em que a cronologia do teatro paranaense ocorre: a academia e o jornalismo. Aqui, eu destaco quatro autores, não necessariamente acadêmicos, cujas publicações se configuram de extrema importância para a nossa escassa bibliografia: os trabalhos de Ignacio Dotto Neto, Selma Suely Teixeira, Marta Morais da Costa e Ivam Cabral.
Se podemos contar nos dedos os livros, certo de que ainda assim cometemos injustiças e esquecimentos, se torna mais difícil numerar a participação de jornalistas e/ou profissionais que usaram o jornal como um meio para se produzir conteúdo e história – sugiro este portal, com vasta documentação. São inúmeros os nomes que, em existentes e já extintos veículos, em diferentes períodos, escreveram sobre teatro no Paraná e, mais especificamente, em Curitiba (é este também um tema: as distâncias entre a capital e outras localidades). Há, também, um curioso movimento: os materiais jornalísticos parecem independer de publicações de outra natureza, enquanto, os livros sobre o tema, por exemplo, não se constituem sem a pesquisa em periódicos. A importância e a responsabilidade do jornalismo são, mais uma vez, atestados, especialmente se tratando de um período sem as tecnologias atuais. Será justo que tudo o que se saiba sobre determinado contexto esteja nas páginas de jornais e na memória de quem presente esteve? O jornalismo está onde ninguém mais está? É o jornalismo quem vai contar a nossa História?
Aos poucos, estou certo, vamos juntos re-constituindo, re-contando, re-configurando e re-narrando a(s) história(s) do(s) teatro(s) daqui.
A História do Teatro Paranaense, definitivamente, tem no ano de 1963 um importante marco: nessa data foram criados o Teatro de Comédia do Paraná (TCP) e o Curso Permanente de Teatro (CPT). Foi Fernando Pessoa, diretor do Teatro Guaíra na época, que viabilizou os dois projetos que foram dirigidos, respectivamente, por Cláudio Correia e Castro e Armando Maranhão.
Houve grande incentivo do então governador do estado, Ney Braga, nessa empreitada para que Curitiba se tornasse “referência em produção teatral no Brasil”. Grandes nomes do teatro paranaense passaram pelo Teatro de Comédia do Paraná: alguns deles são Lala Shneider, Delcy D’Ávila e Edson D´Ávila, José Basso, Maurício Távora, Jane Martins, Sale Wolokita, Fernando Zeni, Eddy Franciosi, Joel de Oliveira, Roberto Menghini, José Maria Santos, Juve Garcia e Christo Dickoff – são, de fato, muitos: fica sempre a sensação de que o recorte é injusto ou insuficiente.
Aos poucos, estou certo, vamos juntos re-constituindo, re-contando, re-configurando e re-narrando a(s) história(s) do(s) teatro(s) daqui.
Segundo a jornalista Celina Alvetti, que durante alguns anos da década de 1980 assinou uma coluna de crítica de teatro no extinto jornal Correio de Notícias, foi a partir do Teatro de Comédia que se realizaram “grandes e aplaudidas produções”, “projetando o nosso teatro nos principais centros do país”. O Teatro de Comédia do Paraná foi responsável por “montagens de peças de autores nacionais como Millôr Fernandes, de clássicos como Shakespeare, ou autores internacionais contemporâneos como Ibsen foram muito bem recebidas pelo público e pela crítica”.
Há muito para se falar sobre o TCP e seus 11 anos consecutivos de produção – suas inúmeras montagens, sua representatividade e importância para se pensar a cultura, o teatro e o artista do Paraná. O que mobiliza esse breve texto, no entanto, é a sua reativação, com o lançamento de dois editais, com vigência para 2016, promovido pelo Centro Cultural Teatro Guaíra (CCTG) e a Secretaria de Estado da Cultura.
Segundo consta, “o primeiro edital se refere à reativação do Teatro de Comédia do Paraná que produzirá no primeiro semestre de 2016 um texto inédito de autor paranaense ou residente no Estado” e o outro “prevê a ocupação dos auditórios do CCTG (Guairinha, Mini e José Maria Santos) por grupos paranaenses que apresentarão peças de classificação adulta e infantil”.
Especificamente sobre o TCP, a reativação, por meio do edital de dramaturgia, prevê a montagem de um texto de autor paranaense no gênero comédia para adultos. É possível se inscrever até 15 de janeiro de 2016 no edital em que um dos itens explicita que o texto não pode “conter personagens que exijam um elenco acima do razoável para as características da montagem pretendida”.
Fala-se em uma “valorização dos autores paranaenses” já que, segundo o secretário de Cultura do Estado, João Luiz Fiani, “o concurso de dramaturgia preenche uma lacuna, a de espaço para os autores do nosso estado. Com o concurso daremos chance a novos e consagrados dramaturgos do Paraná. O melhor texto será encenado pelo TCP e percorrerá um roteiro por cidades do estado, dentro do projeto Circula Paraná. As melhores peças estarão num livro, uma grande oportunidade para valorização dos autores”.
Vem de fora o diretor, no entanto. O nome, dessa vez, é o do paulista Alexandre Reinecke, que também será responsável “pela seleção de cenários e figurinos”. O restante da equipe vai ser escolhida em fevereiro.
É importante se pensar e debater o que, exatamente, significa a retomada desse teatro “institucionalizado” em Curitiba – uma cidade que, segundo Ivam Cabral, desde a década de 1970 (antes mesmo da regulamentação profissional, de 1978) e com maior expressividade na década de 1990 (período em que as escolas de teatro surgem, em maior número), se caracterizou com uma produção de grupos interessados em pesquisas próprias.
O passado não se repete, ainda que se tente.