“A base irrenunciável do teatro é o convívio, daí sua natureza corporal, territorial, localizada. A teatrologia deve conceber métodos de acesse ao estudo do convívio teatral como fundamento material e metafísico do “teatrar”.” Jorge Dubatti, O teatro dos mortos.
O outro é a parte fundamental no teatro, é um convívio da sobrevivência terrestre. Relação emocional para a construção de ser. Social mutação do corpo em novas camadas, uma reprodução do planeta em nossa carne. O teatro é formado por subacontecimentos de um convívio onde somos espectadores da nossa existência. Estamos presentes delineando o futuro de nossas percepções, movimentando com o corpo a poesia visualizada de nosso conhecimento. É distanciamento e sintonia que bate ao mesmo tempo no interno de nosso silêncio.
Para atuar, necessitamos do olhar do outro, de um convívio com a parte que fará o espetáculo acontecer. Devemos configurar o corpo em outras dimensões e vir a ser as entranhas alheias desse mundo diversificado. Passagem de tempo que dispersamos no respirar, mudança de estado em repetições que alcançam a energia do personagem. Somos um corpo só em fronteiras diferentes que se unem ao ritmo do espetáculo. Alcançamos os pequenos detalhes em constante desgaste físico, ensaiamos no outro a moradia que há em nós, planamos em nossas ações para a demonstração do invisível existente no planeta. A transição de um corpo ao outro distorce nosso raciocínio em expurgações andrógenas.
O ator em cena é transversal perante ao outro; alquimista sobrevivente por sentimentos múltiplos, tem o teatro saturado no grau zero da expressão física.
Tudo confunde o tempo-espaço da nossa mente, subtrai sistematicamente as condições existentes do corpo, aperta confrontos com o coração e rompe a ligação com a mente. O corpo olha desgarrado para as informações do mundo procurando adaptá-lo à rotina. Tudo se perde, sai pelos poros e a existência não qualifica o interprete como um ser. A energia no palco sobrevoa, perde a noção de amplitude, esbarra no invisível que detona a imaginação por não superar o ar que o pulmão suga.
O organismo sufoca a intuição acreditando que amanhã será melhor. O outro modifica a condição do outro intérprete, pula ao som da distorção, dilata a percepção na batida cadente da explosão do meteoro, se multiplica em dois pensamentos, torna-se frágil. O jogo de cena entre dois atuantes discorre em passo único, grita em animus, se recompõe e anima. O ator em cena é transversal perante o outro; alquimista sobrevivente por sentimentos múltiplos abastecido pelo teatro saturado no grau zero da expressão física.