No dia 1.º de dezembro, no Teatro José Maria Santos, após a apresentação de Perpétuo, peça escrita por Daniele Crystine e dirigida por Darlei Fernandes, que integrou a Mostra de Dramaturgia e Encenação do Núcleo de Dramaturgia SESI – Teatro Guaíra, houve um debate sobre o espetáculo em questão e, também, sobre o próprio núcleo e o teatro, de maneira mais ampla, com Marcio Abreu e Gracê Passô, com a mediação e participação do crítico e jornalista Valmir Santos.
O debate se configura como um importante momento para se pensar esse evento: o espetáculo, ainda que se baste, não termina em si. É criado um ambiente para que o trabalho, em seus distintos aspectos e elementos, seja tema para a construção coletiva de um pensamento sobre. Há um esforço, que se manifesta de diferentes modos, em diferentes agentes, para que a conversa não seja demasiadamente hierárquica. Instaura-se um diálogo horizontal – e caso isso não se efetive, vez ou outra, provavelmente não se dá por um comportamento ofensivo da parte de quem quer que seja.
É um evento para um público majoritariamente especializado, e isso é importante para se entender uma porção de coisas. Não se trata de uma perspectiva excludente – se refere ao fato de ser um espaço para se articular discursos e práticas que re-pensem o próprio teatro. E isso não é fácil e, às vezes, até mesmo quem é do próprio teatro não quer fazer parte de circuitos que se propõem a investigar / discutir / questionar o teatro em si – pensando, agora, menos nos ímpetos e mais nos desenvolvimentos.
Foi em 2009 que o Núcleo de Dramaturgia do SESI surgiu, com o intuito de formar dramaturgos, criando um espaço de aperfeiçoamento e diálogo. Em 2012, o Teatro Guaíra passou a integrar o projeto tornando-o, então, o Núcleo de Dramaturgia do SESI – Teatro Guaíra. Foram mais de cem dramaturgos formados e, em 2015, a Mostra de Dramaturgia/Encenação atingiu a quarta edição.
O debate se configura como um importante momento para se pensar esse evento: o espetáculo, ainda que se baste, não termina em si.
O projeto, nesse ano, contou com a orientação e a participação de Georgette Fadel, Grace Passô , Marcio Abreu, Maurício Arruda Mendonça e Roberto Alvim. Foi a primeira vez que os dramaturgos e encenadores que participaram do Núcleo durante o ano entraram em contato, de maneira mais efetiva, para que as escolhas de dramaturgias fossem feitas.
Nos outros anos, os textos encenados não precisavam ter sido, necessariamente, desenvolvidos no ano corrente. Dessa vez, Darlei Fernandes e Daniele Crystine, por exemplo, durante o processo de Perpétuo, adotaram metodologias conjuntas de criação. Essa configuração, ainda que não seja partilhada por todos os grupos participantes, promove pesquisas mais verticalizadas, a criação de um vocabulário comum e o encontro, propriamente, de artistas em formação.
O que me interessa registrar nesse texto são algumas das questões levantadas no debate referido. O teatro e a prática teatral são evocados de modo abrangente, ainda que esse evento seja tomado como um terreno do qual partir e sempre retornar: um processo criativo é, no discurso dos debatedores, um exercício que converge uma historicidade, um contexto e as várias circunstâncias que o possibilitam ou não – daí a importância da existência de um espaço de formação que promove diálogos entre artistas atuantes em Curitiba e fora daqui, como é o caso de Grace Passô (Belo Horizonte) e Georgette Fadel (São Paulo), por exemplo.
A reunião de profissionais com vivências e práticas distintas constitui um lugar plural para se pensar e produzir teatro. Além disso, a própria criação de um espaço aberto à produção de discursos compartilhados e construídos coletivamente, incluindo antigos participantes do Núcleo (como é o caso de Jean Carlos Sanchez, Diego Fortes e Léo Moita que integraram debates em outros dias) assim como jovens grupos de teatro, caso do grupo P.U.T.O e Uma (Certa) Cia Cênica, faz do Núcleo um espaço de intersecção da produção local.
A cena é apresentada como um exercício em que estão expostas práticas que têm como norte a experimentação radicalizada que aspira a construção de uma linguagem e a pesquisa formal. Mas não só. A mostra, com momentos tais como o debate, também centraliza pontos fundamentais para quem produz arte: a continuidade de um trabalho (e, antes disso, as possibilidades de existência), os modos de operação e produção em um período em que o teatro é, talvez, em um senso-comum, o meio menos atraente de comunicação, a relação com quem se dispõe a escreve sobre a obra de arte e a sua recepção.
Há espaço para se pensar a própria configuração de um núcleo, institucionalizado – quais os limites e as especificidades que esse círculo apresenta? Independentemente das respostas em si, o questionamento já parece tornar mais vastos os territórios.
Longe de uma perspectiva espetacularizada sobre arte, o Núcleo, pensado aqui especialmente em relação à Mostra, revela sua importância por complexificar as questões teatrais e se afastar dos atalhos comumente apresentados como saídas. Nos resta saber, então, quais são os novos caminhos.
Valmir Santos, editor do Teatrojornal, além de mediar os debates/conversas também fez registros críticos das peças participantes (leia aqui).