Enquanto o mundo explode do lado de fora de nossas casas, a sanidade nesta quarentena também é garantida por uma boa dose de escapismo fútil. E, neste contexto, poucos programas encaixam tão bem quanto o fenômeno da MTV De férias com o ex, um reality show sem competição, sem começo nem fim, e cuja única premissa é jogar um bando de jovens com hormônios altos em uma casa maravilhosa em uma praia paradisíaca no Nordeste. Lá, eles basicamente fazem nada – ou melhor, curtem festas, churrascos, banhos de piscina – e só tem um único “desafio” a enfrentar: o de lidar com a chegada de um ex-crush na mesma casa.
Não há muito mais a descrever do que isso, e mesmo tão simples, De férias com o ex bomba nas redes sociais. Dentro da casa, os participantes se expõem de formas poucas vistas antes na televisão: ficam o tempo todo de roupa de banho, embriagam-se, brigam e reconciliam-se, beijam-se e agarram-se sempre que surge a oportunidade e fazem sexo o tempo todo diante das câmeras e diante dos outros colegas. É como um Big Brother Brasil radicalizado, elevado à enésima potência, mas sem prêmio de um milhão e meio de reais. A recompensa por participar desse programa, afinal, é a própria visibilidade.
Confesso que o programa, para mim, é cercado de incógnitas: por que as pessoas vendem sua intimidade em rede nacional? E qual a graça de assistir a um programa que parte do nada e chega a lugar nenhum? Quem são os espectadores cativos que torcem para essas pessoas das quais não sabemos nada, a não ser a imagem e a queda para a “zueira”? De férias com o ex é tão bizarro que chega a ser fascinante.
Confesso que o programa, para mim, é cercado de incógnitas: por que as pessoas vendem sua intimidade em rede nacional? E qual a graça de assistir a um programa que parte do nada e chega a lugar nenhum?
A atual temporada 6, que tem sido referida pelos fãs nas redes como fraca, traz algumas novidades. Provavelmente a principal delas é a inclusão de homossexuais masculinos, um tabu ainda para o programa – uma vez que muitas participantes mulheres se assumiam como bissexuais nas temporadas anteriores e beijavam outras meninas, mas o contrário (homens bissexuais) nunca foi recebido na casa. Carregava-se, assim, um evidente sexismo que aceitava a homossexualidade feminina claramente pela ótica do “macho”, que considera o carinho entre mulheres tolerável, pois o excita, mas não suporta ver homens fazendo a mesma coisa (esta visão heteronormativa, inclusive, havia sido denunciada pela participante Hana na temporada anterior). Por isso, há um ponto positivo nesta temporada.
No mais, o sucesso de reality shows como esse diz respeito à capacidade de reunir personagens razoavelmente marcantes na mente de quem assiste. De férias com o ex junta mais jovens do que o espectador é capaz de contar. Mas talvez os protagonistas sejam Matheus Crivella, o “Novinho”, um promoter malandrão amigo de celebridades como Anitta, e a naturista Mina, uma gaúcha formada em Hotelaria que seguidamente fica pelada durante conversas em grupo. Correndo próximo a eles, despontam o “vida loka” Igor, um moço cujo rosto e voz rouca sugerem uns vinte anos a mais do que ele realmente tem; a cobiçada Bárbara, uma linda moça, extremante fina, que puxa a peixeira quando confrontada; o “macho alfa” Hadad, que não consegue entender por que Bárbara não cede aos seus encantos e acha que está arrasando todos os corações femininos; e o ator gay Rafael que vive um quadrisal (?) cheio de conflitos com Jarlles, Matheus e Leo.
É difícil categorizar esses jovens: por um lado, eles parecem absolutamente modernos e vanguardistas, cultuando uma vida hedonista sem amarras tal como os ideais hippie nos anos 70, além de desapegados às visões binárias de gênero; por outro, parecem bem conservadores em certos momentos (para não dizer machistas) e estão o tempo todo discutindo apego e analisando cada microatitude que têm uns com os outros.
No resto, a lógica segue a mesma: millenials encarcerados que passam todo o tempo discutindo sobre seus dramas emocionais e sexuais, como se não houvesse um mundo lá fora nem contas para pagar – mais ou menos como é a vida de todo adolescente de 15 anos, em que os crushs ocupam 99% do esforço mental (não levemos em consideração que, no De férias com o ex, tem marmanjo beirando os 30 anos). O programa da MTV, portanto, funciona como uma espécie de oásis do hedonismo: tudo que interessa é aquele microcosmo e as discussões sem relevância que ele é capaz de levantar. Não é por acaso que todo mundo que entra nesta casa mal é apresentado para além do nome, sobrenome, tatuagens e preenchimentos labiais (não sabemos a profissão de nenhum deles, por exemplo).
Na temporada 6, algumas “tramas” são as seguintes: o Igor está sendo sacana com a Scarlat quando diz que não quer ficar apenas com ela e dá em cima da Rebeca? A Barbara está enrolando o Hadad e o Novinho e na verdade só quer ser bajulada, mas sem pegar ninguém? A Flávia e o Vitor mantêm um relacionamento abusivo? O ciúme da Mayara é normal? A Camila está certa na sua raiva contra a Barbara, ou deveria na verdade brigar com Hadad? O Rafael está certo nos chiliques que tem com Jarlles? Jarlles está sendo escroto com Rafael, Matheus e Leo, ou só está sendo honesto que não quer se apegar a ninguém?
Todas são questões que não mudam a vida de ninguém nem nos levam a lugar nenhum. Por isso mesmo, De férias com o ex, com seu gostinho de entretenimento inútil, é uma companhia perfeita para tirar umas “férias” do cérebro durante esse período da quarentena – nem que seja apenas por uma horinha.