Manifest é uma das apostas da NBC para a atual fall season. O misterioso drama da emissora narra a história de uma série de pessoas (191, mais precisamente) presentes no voo 828 da Montego Air que reaparecem após cinco anos sumidas. Se a premissa traz à mente do leitor Lost ou alguma dos tantos seriados que acompanhamos que tentaram emular a “fórmula” criada pela “turma da ilha” (FlashForward, Fringe, John Doe, The Leftovers, Dark, Sense8 – só para ficar em algumas), fique tranquilo, você não está só.
Mas, se tantos anos depois, programas como Manifest raramente são bem-sucedidos (Sense8 tem uma legião de fãs, enquanto The Leftovers ganhou ares de série cult), por que apostar em um drama de mistério sobrenatural repleto de reviravoltas, justamente estas que, aparentemente, tornam a experiência frustrante? Admito que procurei resposta a esta pergunta e não encontrei, principalmente com as reações conflituosas da NBC para com o show.
Apesar de uma estreia com excelentes números, Manifest ganhou ordem de temporada completa com apenas 16 episódios (sendo que inicialmente seriam apenas 13), ao contrário dos convencionais 22/24 episódios; os números vêm caindo constantemente, ainda que o programa tenha conseguido uma sequência de cinco semanas com a melhor audiência das segundas-feiras na emissora, e segue na bolha do canal no que concerne à renovação ou não dela.
Escrita e produzida por Jeff Rake (The Mysteries of Laura), Manifest tem a seu favor inspirações mitológicas muito bem feitas, enquanto o mesmo não se pode dizer das bases religiosas (algo que The Leftovers fez muito, muito melhor). O voo 828 retornava da Jamaica lotado e, em virtude de um overbooking, alguns passageiros precisaram ser remanejados. Entre eles estão os irmãos Michaela (Melissa Roxburgh), uma policial em Nova Iorque, que vive incertezas em seu relacionamento,e Ben Stone (Josh Dallas), economista cujo filho Cal (Jack Messina) luta contra um câncer, tratamento que criou atritos na relação com a esposa. Ambos são os verdadeiros protagonistas da série (ainda que outros personagens tenham seus momentos de destaque).
Rake e sua equipe precisam encontrar uma forma de dar melhor equilíbrio ao programa, antes que as inúmeras reviravoltas afastem qualquer possibilidade de renovação.
Após uma breve turbulência, o voo chega ao espaço aéreo de Nova Iorque, mas é desviado para um aeroporto vizinho. Ao desembarcarem, são recebidos por agentes do FBI, que lhes informam que estão em novembro de 2018, ou seja, desaparecidos há cinco anos. A comoção gerada pelo retorno (e também a repulsa de parcela da população, que os enxerga como um signo de pecado cristão) dos passageiros dura pouco, já que muitos destes começam a ouvir vozes e a sentir forças invisíveis. Desde o episódio piloto, muitas perguntas surgem na mente do espectador: O que realmente aconteceu? Foi um evento aleatório ou estas pessoas têm algo de especial? Qual o propósito do retorno deles?
Um problema inicial na série é a dificuldade aparente em definir se o apelo do show recairá sobre a mitologia, a filosofia ou o cristianismo – já que amalgamar estes elementos em um enredo estruturado não foi possível. Essa zona cinza em que não sabemos as intenções básicas de Manifest causam um ligeiro mal-estar no público; afinal, os diálogos e episódios são genéricos ou fazem parte de um contexto mais amplo?; a série opta pelo estilo procedural ou é um seriado sequencial? Por que certos personagens têm suas histórias abordadas com maior requinte e, do nada, parecem desaparecer da trama, como se não importassem mais?
Contudo, é importante salientar que Manifest possui, sim, qualidades. O argumento da série é interessante e possui ganchos suficientes para serem trabalhados ao longo desta e de eventuais próximas temporadas. Questionamentos sobre nosso papel no mundo e de que forma nossas relações estão intrinsicamente ligadas estão presentes em todos nós, logo são angústias que não cessam. Ainda, o sobrenatural e o divino cercam nossas relações sociais e com o mundo, sendo motivo para reflexões constantes.
Não obstante, Rake e sua equipe precisam encontrar uma forma de dar melhor equilíbrio ao programa, antes que as inúmeras reviravoltas afastem qualquer possibilidade de renovação – pecado que custou muito a Lost da quarta temporada até seu fim. Às vezes, ser excessivamente ousado pode custar caro.
https://www.youtube.com/watch?v=LjsFg7e-ffk