Você pode não ter ouvido falar dos Sleaford Mods, mas isso só reforça a desconexão entre o que alguns consideram “música” e o que Jason Williamson e Andrew Fearn fazem. Porque, honestamente, chamar o que eles fazem de música é quase reduzir o impacto da coisa toda. Sleaford Mods não é só uma banda; é uma experiência sociopolítica encapsulada em loops de batidas mínimas e um monólogo ácido sobre o estado em que estamos.
Com show único marcado para São Paulo no próximo dia 2 de novembro, no Carioca Club, a “maior banda de rock’n’roll do mundo”, como afirmou Iggy Pop, trará a turnê mundial de seu mais recente disco, UK Grim, de 2023. Promovido pela Maraty (André Barcinski e Leandro Carbonato), a apresentação tem várias razões para ser vista, como a abertura da Black Pantera, mas as principais são os dois integrantes da banda.
Quem faz a Sleaford Mods?
Jason Williamson, a voz da dupla, não canta — ele cospe, e raramente com polidez. Seu estilo vocal é uma mistura de desdém e frustração, como um homem que já viu de tudo e não se surpreende com mais nada. Ele ataca cada faixa como um monólogo sarcástico sobre a desintegração da classe trabalhadora britânica, o materialismo fútil, os políticos corruptos e a cultura do hype das celebridades. A raiva dele é palpável, mas nunca perde uma estranha cadência poética, como se Mark E. Smith dos The Fall tivesse lido o jornal diário e decidido que era hora de explodir.
Ao lado dele, Andrew Fearn faz algo que beira o anticlímax e o brilhantismo minimalista. Ele não é o tipo de produtor que se senta em estúdios cheios de sintetizadores analógicos ou samplers vintage. Em vez disso, o cara parece mais um artesão de loops, apertando play em seu laptop, um copo de cerveja em uma mão, como quem diz: “Isso aqui é simples, mas é mais do que o suficiente”. E, de fato, é. As batidas cruas, repetitivas e sem frescuras são o pano de fundo perfeito para o que Williamson faz. Eles não precisam de muito – até porque a sofisticação excessiva seria um insulto à honestidade brutal deles.
Entendendo o duo
Musicalmente, Sleaford Mods fica em algum lugar entre o punk, o rap e a eletrônica minimalista. Mas dizer isso é como tentar descrever o sabor da cerveja barata num bar decadente: só faz sentido quando você está lá, ouvindo. A estética deles é quase um antídoto para o que as bandas de rock ou indie modernas têm tentado fazer. Eles não têm pretensões de grandeza musical ou visual. Se você vê uma apresentação ao vivo, não espere uma produção elaborada — o palco geralmente é Fearn parado ou pulando, clicando no laptop, enquanto Williamson se movimenta, cuspindo suas letras como um pregador de rua irritado com o mundo.
Mas a mágica dos Sleaford Mods está em como conseguem transformar o mundano e o miserável em algo irresistivelmente magnético.
Mas a mágica dos Sleaford Mods está em como conseguem transformar o mundano e o miserável em algo irresistivelmente magnético. Eles falam sobre ser pobre, sobre a hipocrisia da política, sobre o lado feio da sociedade moderna – e fazem isso com um sarcasmo que, de alguma forma, te faz rir. Não porque as coisas sejam engraçadas, mas porque é o único jeito de lidar com o absurdo. Se os tempos são de crise, os Mods são o cronista perfeito, uma voz irônica e raivosa, mas também esquisitamente libertadora.
O resultado disso tudo? Bem, para aqueles que não os entenderam, Sleaford Mods é barulho, simples assim. Para os que sacaram a piada, é a trilha sonora do apocalipse social que estamos vivendo, um lembrete de que, mesmo no meio do caos, ainda podemos rir – mesmo que seja de nervoso.
SERVIÇO | Sleaford Mods em São Paulo
Onde: Carioca Club (R. Cardeal Arcoverde, 2899 – Pinheiros, São Paulo/SP);
Quando: 02 de novembro, a partir das 17h; Black Pantera (18h); Sleaford Mods (19h15);
Quanto: ingressos a partir de R$ 190, à venda no Clube do Ingresso;
Classificação etária: 16 anos.
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