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Home Crônicas Henrique Fendrich

Houve um dia em que não vi meu pai

porHenrique Fendrich
20 de abril de 2016
em Henrique Fendrich
A A
"Houve um dia em que não vi meu pai", crônica de Henrique Fendrich.

Imagem: Reprodução.

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Houve um dia em que não vi meu pai – o dia inteirinho e eu não vi meu pai. Ele saiu de casa antes que eu acordasse e voltou quando eu já estava dormindo. Foi uma viagem que ele fez, não era uma viagem longa, mas o suficiente para impedir o nosso encontro. E até a última hora eu achei que ele chegaria e nós nos veríamos. Mas não aconteceu assim. Aquele dia – era um 8 de setembro – foi mesmo o primeiro dia em que não vi o meu pai.

Isto é, ele também havia viajado quando eu ainda era bebê, e viajado para mais longe, havia ficado semanas fora. Meu pai já havia ficado vários dias sem me ver, e diz a história familiar que eu o estranhei quando voltou. Mas eu mesmo não me lembro de nada disso, não tinha consciência de coisa alguma. Desde que alcancei a idade da razão, eu nunca havia deixado de vê-lo – até aquele dia.

Ah, o meu pai, fazíamos mais do que disputar pelo amor da minha mãe. Por exemplo, jogávamos futebol de botão. Fazíamos campeonatos de futebol de botão. Mas nunca terminávamos nenhum, lá pelo meio a gente sempre se desentendia e acabava desistindo. Dois sujeitos de touro, aí já viu. Vez ou outra tínhamos um arranca-rabo, e a consequência disso era que, antes de dormir, eu não tinha certeza se devia ir até ele para dar um beijo de boa noite. Ele lá, lendo o jornal, a televisão ligada, e eu parado no corredor, na dúvida se devia entrar, sem saber se a nossa briga já era coisa do passado ou devia ser mantida. Houve um dia – e desse eu não lembro a data – em que achei que eu já estava grandinho demais para dar beijo de boa noite antes de dormir. E nunca mais houve um.

Houve um dia – e desse eu não lembro a data – em que achei que eu já estava grandinho demais para dar beijo de boa noite antes de dormir. E nunca mais houve um.

Estava crescendo, já ganhava a maioria das partidas no videogame. Um dia eu fiquei jogando pingue-pongue no colégio depois do horário e meu pai apareceu para me buscar. Primeiro ficou olhando, esperando até que eu perdesse, para que pudéssemos ir embora. Mas naquele dia eu estava com tudo e não havia quem me batesse. E o meu pai então pediu emprestada uma raquete e decidiu entrar na brincadeira. Ah, ali estava um desafio pra mim. Se ganhasse de meu pai, se ganhasse de um adulto, para quem haveria de perder? Seria a glória diante dos meus amigos, que estavam contando com a vitória do meu pai.

Já fazia algum tempo que não jogava com ele. Em casa, virávamos a mesa de futebol de botão, colocávamos em cima de um banquinho e usávamos fitas VHS como rede. Mas ali a coisa era mais profissional, a mesa era de verdade. Quando chegou a vez de meu pai, eu me preparei para dar o melhor saque da minha vida. Quis botar tanto efeito na bolinha quanto possível. O fundamental era que eu ganhasse dele. E a bolinha foi, e o meu pai rebateu mal, torto, torto, e a bolinha foi parar longe da mesa. Ainda tentou se desculpar: “Mas também, com um saque desses….”. Eu havia conseguido, havia vencido meu pai de tal forma que ele havia passado vergonha. Eu era melhor que ele, e aquilo doía – nunca me perdoei.

Eram coisas que aconteciam no tempo em que nos víamos todos os dias, e não apenas no Natal, como hoje em dia. De vez em quando eu ainda acho que ele chegará, até o fim do dia ele chegará – e nós então, finalmente, terminaremos aquele campeonato de futebol de botão.

Tags: Crônicapaispaternidade

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